Caso queira assistir previamente ao referido vídeo, este é o link.
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ICK – Instituição Cultural Krishnamurti
Desde 1935 divulgando oficialmente os ensinamentos no Brasil
Face ao reduzido número de colaboradores, o atendimento ao público na sede da ICK precisa ser previamente agendado pelo e-mail ick@krishnamurti.org.br.
Pergunta: Que é a sociedade?
Krishnamurti: Que é a sociedade? Que é a família? Investiguemos, passo a passo, como se cria a sociedade, como nasce ela. Que é a família? Quando dizeis “minha família”, que entendeis? Meu pai, minha mãe, meu irmão, minha irmã, o sentimento de aconchego, o sentimento de que vivemos todos na mesma casa, o sentimento de que meu pai e minha mãe irão proteger-me, a posse de certos bens, de joias, sáris, roupas. Esse é o começo da família. Há outra família igual a minha, que vive noutra casa, que sente o mesmo que eu sinto: o sentimento de “minha casa”, “minhas roupas”, “meu carro”, “minha esposa”, “meu esposo”, “meus filhos”; e mais outra família existe, que também sente exatamente a mesma coisa; de maneira que dez famílias residentes num mesmo lugar, sentindo as mesmas coisas, adquirem o sentimento de que não devem ser invadidas por outras famílias. Por conseguinte, começam a fazer leis. As famílias poderosas se instalam em melhores posições, têm grandes propriedades, mais dinheiro, mais roupas, mais carros. Reúnem-se, pois, as dez famílias e estabelecem leis que determinam o que devemos fazer. E assim, gradualmente, nasce uma entidade social, com leis, regulamentos, polícia, exército, marinha. Por fim, toda a superfície da terra está povoada por diferentes entidades sociais. Depois, algumas pessoas adquirem certas ideias e querem derribar as que se estabeleceram em certas posições e que têm o poder nas mãos. Dissolvem essa sociedade e formam outra.
A sociedade é constituída das relações entre as pessoas: relações de uma família com outra família, de um grupo com outro grupo, e dos indivíduos com a sociedade. Desse modo, as relações é que constituem a sociedade, as relações entre indivíduos, entre vós e mim, estabelecem a sociedade. Se sou ganancioso e disponho de poder, expulsar-vos-ei de vossa posição. E vós procedereis da mesma forma comigo. E, também, vós e eu elaboramos leis; e vêm outros e destroem as nossas leis e estabelecem um novo conjunto de leis; e assim por diante, indefinidamente. Na sociedade, como nos relacionamentos, há um conflito constante. Essa é a base simples da sociedade e ela se torna cada vez mais complicada à medida que os entes humanos se tornam mais complexos nas suas ideias, nas suas instituições mecânicas, na sua indústria.
Pergunta: Por que desejam as pessoas viver em sociedade? Elas podem viver sós.
Krishnamurti: Podeis viver só?
Pergunta: Vivo em sociedade porque meu pai e minha mãe pertencem ao meio social.
Krishnamurti: Para terdes emprego, para viverdes, para ganhares a vida, para fazerdes qualquer coisa, não precisais viver em sociedade? Podeis viver só? Para terdes alimento, dependeis sempre de alguém; de alguma pessoa dependeis para terdes roupas; mesmo que sejais um Sanyasi, dependeis de outro para terdes o que comer, o que vestir, onde morar. Não se pode viver sozinho. Não há entidade que exista completamente só. Estamos sempre em relação; apenas na morte se pode estar só. Na vida, estamos sempre em relação, em relação com nosso pai, nosso irmão, com o mendigo, o calceteiro, o Tahsildar, o coletor. Estais sempre em relação e, porque não compreendeis essa relação, existe conflito. Mas quando compreendemos a relação entre um homem e outro, não há conflito, nem problema relativo ao viver só.
Do livro NOVOS ROTEIROS EM EDUCAÇÃO – Uma Abordagem Radical, Jiddu Krishnamurti
Krishnamurti realizou estas palestras em Rajghat-Banaras, às margens do rio Ganges, durante o mês de dezembro de 1952, em presença de jovens de ambos os sexos, entre as idades de 9 e 20 anos.
Segue um resumo do diálogo. Clique nos links para acessar o referido trecho. Se desejar legendas em português, clique no botão “CC” no canto do vídeo.
00:00 – 01:00
Nesta seção do vídeo, Krishnamurti e os cientistas discutem a possibilidade de uma ação que não seja limitada pelo conhecimento. Eles exploram as limitações do conhecimento e como isso leva à divisão e ao conflito. A conversa adentra a distinção entre a inteligência nascida do pensamento condicionado e uma inteligência que opera além do pensamento. Enquanto alguns expressam ceticismo, o palestrante sugere que é de fato possível perceber sem a interferência do pensamento. Os participantes enfatizam a importância de observar a própria mente e investigar se há uma ação que não seja limitada e não esteja ligada ao conhecimento.
00:00 Nesta seção do vídeo, o Dr. Hancke sugere um diálogo amigável em que os participantes abordem as questões com hesitação, em vez de afirmações. A discussão gira em torno da possibilidade de o cérebro estar em um estado de não registro e da importância de lidar com fatos em vez de teorias ou especulações. Eles mencionam o fato de que o cérebro funciona no momento presente para a comunicação, mas usar o termo “cérebro” em si é considerado uma inferência teórica. A conversa então se volta para a questão de se a percepção está conectada ao cérebro ou separada dele.
00:05 Nesta seção, os participantes discutem o fato de experimentar dor e o desejo de se libertar dela. Eles questionam como abordar esse fato e se discutir a dor sem realmente vivenciá-la se torna uma discussão teórica. A conversa então passa para a relação entre dor e cérebro, com alguns participantes destacando que invocar a palavra “cérebro” traz consigo um conjunto de inferências e teorias do passado. Eles exploram a ideia de que o cérebro estar ligado à dor não é algo que eles observam diretamente no momento presente. Em geral, eles lidam com o desafio de lidar com fatos sem se envolver em teorias e conhecimento passado.
00:10 Nesta seção do vídeo, Krishnamurti aborda a natureza dos fatos e do conhecimento. Ele enfatiza que tudo o que temos verdadeiramente são os fatos presentes, como a dor e o desejo de nos libertarmos da dor. Ele reconhece que o uso de termos científicos como “cérebro” pode nos conectar a suposições e teorias, mas também reconhece a importância da ciência na exploração da relação entre dor e conhecimento. Krishnamurti define conhecimento como a acumulação de experiências armazenadas como memória no cérebro, o que dá origem ao pensamento. A conversa continua a aprofundar o papel do conhecimento científico no enfrentamento da dor e se ele pode contribuir para encontrar uma solução.
00:15 Nesta seção, Krishnamurti discute a relação entre conhecimento e ação. Ele afirma que o conhecimento está armazenado no cérebro e que funcionamos com base nesse conhecimento acumulado. No entanto, ele questiona se a ação realmente nasce do conhecimento ou se há outro tipo de ação que não está limitada pelo passado ou futuro. Os cientistas presentes na discussão expressam sua incerteza e Krishnamurti sugere que eles explorem mais a natureza da ação.
00:20 Nesta seção, os participantes discutem se há uma ação que não seja limitada e que não leve ao conflito. A conversa começa com a pergunta se a ação nascida do conhecimento está sempre limitada. Um participante questiona se pegar um copo e beber água é limitado e leva ao conflito. Outro participante esclarece que é limitado no sentido de que diferentes indivíduos têm abordagens diferentes devido ao conhecimento acumulado, mas isso não necessariamente leva ao conflito. Krishnamurti destaca que ações motivadas pelo egocentrismo, nacionalismo e outras perspectivas limitadas são a causa do conflito. Eles concordam que ações psicológicas e até mesmo ações físicas podem ser limitadas e levar ao conflito quando baseadas no eu. A discussão aborda a possibilidade de uma ação limitada sem referência ao eu, mas Krishnamurti argumenta que qualquer ação nascida da limitação inevitavelmente resultará em conflito. Além disso, ele explica que se um cientista está apenas preocupado com sua carreira e pesquisa, isso é um assunto limitado que desconsidera o mundo externo e pode contribuir para o conflito.
00:25 Nesta seção, Krishnamurti e os participantes do seminário discutem a relação entre conhecimento, ação e conflito. Eles concordam que toda ação nascida do conhecimento limitado é em si limitada e gera divisão, o que acaba levando ao conflito. Eles exploram a ideia de que não é a divisão em si que é conflituosa, mas sim a adição de um ponto de referência sólido ou “eu”. Eles usam o exemplo do ecossistema para demonstrar como ações limitadas ainda podem funcionar harmoniosamente dentro de um sistema maior. No entanto, eles também reconhecem que os seres humanos adicionam um elemento extra de egocentrismo ao seu conhecimento, o que agrava ainda mais o conflito. A conversa termina com o reconhecimento de que a divisão combinada com a sensação de estar certo é o que tem causado conflitos no mundo.
00:30 Nesta seção, a conversa gira em torno da distinção entre conhecimento e egocentrismo. Os participantes discutem as limitações do conhecimento e como ele leva à divisão e ao conflito entre os seres humanos. Krishnamurti sugere a necessidade de uma ação que vá além dessas limitações para resolver os problemas que a humanidade enfrenta, enfatizando a importância da comunicação e da renúncia a identidades divisórias. Os participantes consideram duas possibilidades: encontrar uma ação que não seja limitada pelo conhecimento ou aprender a agir mesmo que nascida de conhecimento limitado, mas não centrada na defesa de um ponto de vista específico.
00:35 Nesta seção do vídeo, há uma discussão entre os cientistas sobre a possibilidade de uma ação que não seja limitada pelo conhecimento. Enquanto alguns argumentam que toda percepção e ação são governadas pelo que já sabemos, outros questionam se há uma maneira de ter uma ação ilimitada. A ideia de que as crianças têm uma visão mais aberta e sem restrições do mundo também é mencionada. Em última análise, a conversa aborda a crença de muitos de que há algo superior dentro deles que transcende a existência comum.
00:40 Nesta seção do vídeo, a discussão gira em torno da possibilidade de uma ação que não nasça da limitação. É mencionado um experimento com crianças de três meses, onde seu foco em uma imagem na parede fica claro quando elas sugam um seio de certa maneira. No entanto, surge alguma discordância em relação à percepção e às limitações das crianças. Os participantes então voltam sua atenção para a questão de se a percepção pode existir sem conhecimento. Eles exploram a ideia de ação e percepção ilimitadas, reconhecendo as limitações do quadro científico, mas enfatizando a importância de observar a própria mente. O objetivo é investigar se há uma ação que não seja limitada e não esteja conectada ao conhecimento.
00:45 Nesta seção do vídeo, Krishnamurti explora o conceito de ação sem limitação. Ele destaca que o eu, que é uma coleção de memórias e conhecimento, sempre opera dentro de limitações e leva ao conflito. Krishnamurti levanta a questão se o eu pode chegar ao fim e enfatiza a importância de não se tornar e de abandonar a atividade centrada no ego. Ele destaca como o eu pode enganar e se esconder por trás de diversos aspectos da vida, mas que a verdadeira ação sem limitação só pode surgir quando o eu chega ao fim.
00:50 Nesta seção, Krishnamurti discute o conceito de eu e conhecimento. Ele afirma que o eu, que é uma coleção de memórias e tempo, pode chegar ao fim completamente, mas ainda é possível viver neste mundo. No entanto, ele reconhece que certas ações no mundo, como dirigir um carro ou escrever uma carta, requerem o uso de conhecimento. Krishnamurti argumenta que se o eu não está presente, então a ação não é centrada no ego. Ele enfatiza que a inteligência, que não nasce do conhecimento, pode usar o conhecimento em um contexto específico, mas não tem lugar psicologicamente. Ele postula que a inteligência é diferente do conhecimento e precisa ser explorada mais a fundo.
00:55 Nesta seção, a conversa gira em torno da natureza da inteligência. Eles discutem dois tipos de inteligência: uma que nasce do pensamento limitado e condicionado, e outra que parece vir de algum lugar além do pensamento. Eles destacam que a inteligência nascida do pensamento é limitada e pode levar à crueldade ou bondade dependendo das circunstâncias. No entanto, argumentam que existe uma inteligência que não nasce do pensamento. Eles enfatizam a necessidade de investigar essa inteligência observando sem pensamento e mantendo uma percepção que não se baseia no pensamento. Embora alguns participantes expressem ceticismo, o palestrante sugere que é de fato possível perceber sem a interferência do pensamento, dando o exemplo de ver uma árvore sem a intrusão de pensamentos.
01:00 Nesta seção, os participantes discutem a possibilidade de percepção sem pensamento e o papel do conhecimento na percepção. Eles questionam se é possível ter uma percepção pura, livre da influência do pensamento e da rede associada de palavras. Enquanto alguns argumentam que toda percepção é baseada no conhecimento, outros sugerem a existência de uma inteligência que opera independentemente do pensamento. Krishnamurti afirma que existe essa inteligência e convida a uma exploração mais aprofundada de sua natureza. A discussão então se volta para o tema do amor e sua relação com o desejo, o prazer e a sensação. Krishnamurti enfatiza que o amor não está limitado ou condicionado por esses fatores, e sua investigação é relevante para a indagação geral.
01:05 Nesta seção, J. Krishnamurti discute a natureza do amor e sua conexão com a inteligência. Ele afirma que a inteligência, que não nasce do pensamento limitado, é a essência do amor. Ele questiona se o amor é desejo, ambição ou dependente do prazer, e propõe que o amor é algo além do cérebro. O amor, segundo Krishnamurti, não é o oposto do ódio e não pode coexistir com o apego. Ele enfatiza a importância de descondicionar a mente humana e prosseguir com uma compreensão mais profunda do amor e da inteligência. A seção conclui com um cientista apresentando uma pergunta sobre um bebê de três meses e um experimento, ao qual Krishnamurti responde.
01:10 Nesta seção, a conversa gira em torno do tema do desejo e seu significado em nossas vidas. Eles discutem como o desejo é central para o cérebro e sua relação com a verdade e a investigação. Eles enfatizam a importância de observar as próprias experiências e questionar o lugar e o movimento do desejo. A conversa aborda a ideia de tornar-se psicológico e a necessidade de romper com isso para compreender a realidade do eu. Eles destacam a necessidade de acabar com a medição e a comparação para compreender verdadeiramente a natureza do desejo.
01:15 Nesta seção, Krishnamurti explora a ideia de se há um fim para o conhecimento. Enquanto alguns participantes sugerem que há um fim para o conhecimento, Krishnamurti aponta que funcionar exclusivamente dentro do domínio do conhecimento limita nossa compreensão. Em seguida, ele levanta a questão de se o cérebro pode cessar a constante tagarelice mental e estar vazio, agindo apenas quando necessário. Krishnamurti sugere que há um fim para o conhecimento, mas é um assunto separado do conceito de vazio.
Aos interessados em ampliar o contato com outros observadores de K, e que têm intimidade com a língua inglesa, informamos a existência do site Kinfonet, onde se pode encontrar divulgação de grupos de diálogo, eventos e publicações, além de um fórum de discussões. Para acessá-lo, clique aqui.
Segue um resumo do diálogo. Clique nos links para acessar o referido trecho. Se desejar legendas em português, clique no botão “CC” no canto do vídeo.
00:00 – 01:00
Neste vídeo do YouTube, J. Krishnamurti e um grupo de cientistas exploram diversos tópicos, como observação, compreensão, cérebro e pensamento, memória e hábitos psicológicos. Krishnamurti acredita que a verdadeira observação pode ocorrer sem o observador e que essa abordagem pode levar à compreensão e à mudança no cérebro. O grupo debate se é possível observar sem criar um observador, o papel da memória e do registro psicológico, e a dificuldade de quebrar hábitos. Eles também discutem conceitos como vislumbres de insight, reconhecimento e comunicação completa. O vídeo termina com a pergunta sobre o que poderia quebrar o hábito da memória.
00:00 Nesta seção, os participantes se apresentam e mencionam suas áreas de especialização. O Dr. Hancke pergunta se eles podem usar o pensamento para entender a complexidade do cérebro. Krishnamurti acredita ser possível observar a atividade do próprio cérebro sem buscá-la externamente e que, ao observar com muito cuidado e imparcialidade, é possível abordar esse problema complexo, acrescentando que a observação de si mesmo pode levar à compreensão. A discussão então se volta para o que se entende por “compreensão”.
00:05 Nesta seção do seminário, os participantes discutem a natureza da observação e a relação entre observação e criação de teorias e modelos. Eles exploram a diferença entre meramente observar e criar uma compreensão da observação por meio da ciência e da teoria, e questionam se é necessário ter uma teoria ou modelo para ver o que está realmente acontecendo. A discussão também aborda percepção, aprendizado e a capacidade do cérebro humano de observar e reconhecer diferentes objetos e movimentos no mundo.
00:10 Nesta seção, a discussão gira em torno da observação e se o condicionamento a afeta. O condicionamento causa a divisão entre o observador e o observado, mas a abordagem de Krishnamurti é observar sem preconceitos. Os cientistas questionam o papel da teoria na observação e se é necessário tê-la para observar. A discussão também aborda como se vê as cores vermelha, branca e azul e como diferentes níveis de operações ocorrem na visão. Todos os neurocientistas acreditam que a experiência direta não é possível no nível do olho e do nervo óptico. O ponto de vista de Krishnamurti sobre observação e cérebro é radical e um tanto diferente do que eles aprendem na faculdade.
00:15 Nesta seção, os participantes do seminário discutem as duas maneiras diferentes de olhar para o cérebro: o cérebro teórico composto de fragmentos e partes estudados pelos cientistas, e a outra maneira de olhar para o cérebro como uma entidade inteira que percebe. Eles debatem se uma teoria holística, que leve em conta a fragmentação do cérebro, é possível ou não. Enquanto alguns argumentam que o conhecimento técnico é importante para entender o cérebro, outros expressam desconforto com experimentação em animais. A seção termina com a pergunta de onde começar o estudo do cérebro.
00:20 Nesta seção, J. Krishnamurti e outros palestrantes discutem o conceito de pensamento e sua relação com o cérebro e a consciência. Eles debatem se o cérebro é o centro do pensamento e da consciência, e se o pensamento é um evento que surge da separação de uma unidade de seu contexto ou de uma fronteira ilimitada. A discussão também aborda a questão de qual ação chega ao pensamento e qual é a fonte do pensamento.
00:25 Nesta seção, J. Krishnamurti discute a relação entre pensamento e ação e se é possível observar a causalidade sem o observador. Ele sugere que o observador, ou a pessoa que percebe, é o passado, a memória, o conhecimento e a experiência. A observação real pode ocorrer sem o observador, e não há separação entre o observador e o observado. Quando não há observador, a ação é estar junto sem separação. A separação entre o que observamos e o cérebro pode ser devida à tradição, à educação e às crenças.
00:30 Nesta seção, o grupo discute se é possível observar sem registrar e criar um observador. Krishnamurti sugere que o registro cria o observador, enquanto a observação sem registro permite uma visão pura. No entanto, alguns membros do grupo argumentam que isso é uma teoria e que o cérebro é programado para registrar. Krishnamurti acredita que se separar do que está sendo observado é um processo constante sustentado por colapsos e lampejos do observador, o que leva a contradições. O grupo debate a necessidade tanto da observação quanto do acúmulo no contexto de conhecer alguém pela primeira vez versus um relacionamento contínuo. Por fim, Krishnamurti explica que está usando o termo ‘níveis’ para descrever os diferentes contextos em que a contradição pode ser necessária.
00:35 Nesta seção do vídeo, Krishnamurti e um grupo de cientistas discutem o conceito de registro e memória no cérebro humano. Embora concordem que o conhecimento físico e a memória sejam necessários para a vida diária, Krishnamurti questiona a necessidade de registro e acumulação psicológica. Ele argumenta que o registro interior leva ao processo divisivo que cria o ego, o que causa destruição no mundo. Krishnamurti pergunta se é possível que o mecanismo do ego pare, não criando um “eu” interior. Essa pergunta tem sido feita não apenas por cientistas, mas também por pessoas religiosas sérias.
00:40 Nesta seção, um grupo de cientistas, incluindo um pesquisador cerebral, discute se é possível para os seres humanos viverem sem registrar internamente e desaprender tendências evolutivas de autopreservação. Eles consideram a história do cérebro em construir um mundo estável e solidificar registros, bem como exemplos de pessoas que aparentemente alcançaram tal estado. Krishnamurti os instiga a entender o tempo e, em última análise, questiona se o tempo está contido no agora.
00:45 Nesta seção, os palestrantes discutem a relação entre ação e pensamento e como o observador é o observado. Eles chegam à conclusão de que, quando se percebe que o observador é o observado, não há conflito, o que leva a uma mudança radical no cérebro e a uma revolução. Eles questionam o uso da palavra “possibilidade” e optam por “realidade”, questionando como essa ideia se relaciona com a observação do cérebro sem desmembrá-lo e sem a ajuda de livros.
00:50 Nesta seção do seminário, os participantes discutem a ideia de vislumbres de insight e como eles se relacionam com a memória e a realidade. Krishnamurti explica que um vislumbre de insight pode levar a uma mudança nas células do cérebro se a pessoa prestar atenção e agir sobre isso. No entanto, a maioria das pessoas não presta atenção porque tem muitos interesses e problemas. O grupo também discute a relação entre reconhecimento e memória e o que constitui uma ação necessária.
00:55 Nesta seção, é discutido o tema da memória e se é possível observar sem ficar preso a ela. É mencionado que ter um certo tipo de memória é relevante internamente, mas é um fardo carregar memórias irrelevantes. A conversa então se volta para a dificuldade de quebrar hábitos psicológicos, como a atração por ir ao norte quando se faz isso há 40.000 anos. Sugere-se que uma comunicação completa, com a qualidade da voz e do ser, possa facilitar a quebra desses hábitos, mas isso requer falar a verdade em vez de teoria. A pergunta sobre o que quebraria o hábito da memória fica sem resposta.
01:00 – 01:20
J. Krishnamurti e um grupo de cientistas discutem a relação entre memória, pensamento e segurança. Eles exploram como as memórias podem criar falsas sensações de segurança e inibir a mudança, enquanto o cérebro busca constantemente segurança inventando ilusões. A discussão conclui enfatizando a importância de compreender o próprio processo de pensamento para se libertar do condicionamento e abordar a vida com uma nova perspectiva. O grupo mergulha nas limitações do pensamento e como ele é baseado na memória, levando a conflitos e divisões. Eles enfatizam, em última instância, a necessidade de consciência e insight para transformar verdadeiramente o pensamento de alguém.
01:00 Nesta seção, J. Krishnamurti discute a necessidade da memória em certas atividades, incluindo a comunicação linguística, dirigir, ler e escrever, enquanto instiga os seres humanos a descartarem memórias desnecessárias. A conversa então aborda a ideia de segurança e a luta por ela. O grupo discute como as memórias frequentemente podem criar falsas sensações de segurança, inibindo a capacidade de mudança de uma pessoa. A conversa conclui afirmando que o nível de energia mais elevado do cérebro só pode ser alcançado quando uma pessoa se sente segura, embora uma sensação de segurança possa inibir a mudança.
01:05 Nesta seção, J. Krishnamurti e um grupo de cientistas discutem como o cérebro busca segurança ao inventar ilusões, como relacionamentos, fé em deuses e contas bancárias. Eles observam que, embora o cérebro esteja continuamente em busca de segurança, ele também se oferece segurança no processo de insegurança real. Os cientistas levantam o ponto de que estamos tão acostumados ao que podemos entender que falhamos em ver a loucura de nossas ações. Eles acreditam que o processo de aprendizagem estabiliza a transição para a mudança, que pode levar uma vida inteira. Enquanto isso, Krishnamurti insiste que a mudança pode acontecer quando chegamos a uma consciência de nós mesmos.
01:10 Nesta seção, J. Krishnamurti e os cientistas discutem a natureza do pensamento e suas limitações. Eles concordam que o pensamento é limitado, pois é baseado na memória, que está confinada à nossa experiência e conhecimento. Essa limitação leva a conflito e divisão, o que torna necessário encontrar uma maneira para o pensamento operar em um lugar adequado. No entanto, introduzir a ideia de que o pensamento é usado em um lugar e não em outro causa confusão e fragmentação. Enquanto isso, eles discutem a diferença entre saber e entender, pois não necessariamente significam a mesma coisa em diferentes idiomas.
01:15 Nesta seção, os palestrantes estão discutindo a ideia de insight e sua relação com a memória e o pensamento. Eles questionam se o insight pode ser obscurecido pelo pensamento ou se permanece inabalável. O grupo concorda que o insight é um tipo de percepção instantânea, livre de memória e tempo, que tem um efeito duradouro em uma pessoa. Krishnamurti usa o exemplo de ver a futilidade da religião organizada e nunca mais olhar para trás. Eles concordam em retomar a discussão em outro momento.
01:20 Nesta seção, Krishnamurti reflete sobre a natureza do pensamento e como a mente tende a repetir padrões que já experimentou ou aprendeu anteriormente. Ele coloca a questão de se é possível abordar a vida com uma perspectiva contínua, fresca e nova, em vez de ficar preso a velhos hábitos de pensamento. Krishnamurti sugere que essa liberdade do condicionamento requer uma profunda consciência dos próprios processos de pensamento e a capacidade de observá-los sem julgamento.
O texto foi gerado pelo software Summarize e traduzido pelo software ChatGPT. Ao final, a pessoa que publicou fez algumas poucas correções. O que você achou desse tipo de postagem? Acha útil que se faça o mesmo para outros vídeos de K? Fique à vontade para comentar e nos ajudar a decidir o conteúdo das próximas postagens. A ICK agradece.
O Encontro Anual de Maio da KFA ocorreu recentemente, significando uma ocasião importante dentro da agenda anual da Fundação.
Os participantes se reuniram ansiosamente para conhecer novos e velhos amigos, ouvir palestras, participar de discussões e apreciar a beleza serena do campus da Oak Grove School, em Ojai, Califórnia.
Se você quer ver as gravações dessas palestras, clique aqui. É possível configurar as legendas para o português, geradas automaticamente.
Essas gravações estarão disponíveis até agosto.
A Instituição Cultural Krishnamurti existe desde 1935 e a sua principal finalidade é traduzir e disponibilizar os ensinamentos de Krishnamurti, com a máxima fidelidade.
Durante anos, a ICK promoveu a tradução e a publicação de livros e vídeos, encontros públicos e discussões em grupos. Entretanto, o advento e a popularização da Internet agora permitem que a Instituição tenha presença virtual relevante entre os estudiosos de Krishnamurti em língua portuguesa.
Continuaremos a promover encontros, mas agora com foco nos virtuais, considerando principalmente a grande dispersão geográfica do nosso público.
“Somente no espelho dos relacionamentos a mente pode ser compreendida” (Krishnamurti)
Queremos que o público encontre em nós uma fonte confiável e autêntica dos ensinamentos e, para tanto, contamos com um grupo de incansáveis colaboradores. Mantemos também contato permanente com as fundações, notadamente a KFT – Krishnamurti Foundation Trust, para conseguir a necessária sinergia para os nossos trabalhos.
Ajudem-nos a manter acesa a chama de Krishnamurti, participando dos nossos encontros virtuais e nos ajudando a ampliar o alcance dos ensinamentos produzindo traduções de vídeos e textos.
Bate-papo e mensagens instantâneas seguros.
Não requer registro, nem precisa instalar nada, pode entrar com a conta do Element, Google, Facebook ou Apple.
Entrem na nossa sala pública Observadores de Krishnamurti e encontrem outros estudiosos dos ensinamentos.
Os ensinamentos são importantes por si mesmos e intérpretes ou comentadores apenas os distorcem, sendo aconselhável ir diretamente à fonte, os próprios ensinamentos, e não se valer de nenhuma autoridade.
Jiddu Krishnamurti
Quer conversar sobre os ensinamentos de K? Então, clique aqui, entre em uma de nossas salas virtuais no Element, e junte-se a uma conversa já em andamento ou inicie uma nova.
Informamos o falecimento, em 13/07/22, do Sr. Onofre Maximo, que por décadas administrou e protegeu a ICK de sua extinção, por muitas vezes solitário, oferecendo, através do seu zelo contínuo, a oportunidade de traduzirmos um grande volume de material — textos, vídeos e livros — o que proporcionou o acesso dos falantes da língua portuguesa à grande parte da mensagem de Krishnamurti.
Estaremos posteriormente dando continuidade ao trabalho da ICK, para adaptá-lo mais plenamente às novas formas de comunicação digital.
Agradecemos a todos os tradutores e revisores que colaboraram, durante todas essas décadas, e à nossa querida colaboradora e tradutora Maristela Nicolellis, que coordena a equipe atual, tornando possível a disponibilização da mensagem de Krishnamurti aos falantes da língua portuguesa. Esse trabalho incansável já produziu mais de 200 traduções, disponíveis no canal oficial da Krishnamurti Foundation Trust (kfoundation.org/1/pt-video), oferecendo a todos uma oportunidade de descobrir uma nova maneira de viver.
ICK
A ICK, em parceria com a KFT, acaba de publicar pela Amazon o seu primeiro ebook. Trata-se de “O findar do tempo”, que já constava do nosso catálogo de livros físicos há algum tempo e agora está sendo disponibilizado em formato eletrônico, atingindo assim um maior número de leitores e proporcionado a economia que esse tipo de publicação traz.
Estes diálogos entre Jiddu Krishnamurti e o físico teórico David Bohm começaram por abordar a origem do conflito humano. Ambos concordaram em atribuir isto à natureza separatista e presa ao tempo do self e à forma com que ela nos condiciona a confiar erroneamente no pensamento, que está baseado na experiência passada inevitavelmente limitada. A possibilidade do insight que terminará com esta mentalidade defeituosa foi discutida em profundidade. O foco então mudou para uma investigação do significado da morte, e uma discussão investigando as razões do ser e o lugar da consciência no universo. Os diálogos finais revisam o vínculo profundo que Krishnamurti e Bohm viram entre estas questões essenciais e a vida do dia a dia, e o que podemos fazer sobre as barreiras que se encontram no caminho. Ajuda – não palavras. Como você ajudaria outra pessoa a chegar a isso? Entende o que estou tentando dizer?
O Centro de Estudos de Tiradentes – MG, organiza periodicamente encontros para diálogos e vivências para pessoas ou grupos interessados em aprofundar os temas abordados por Jiddu Krishnamurti. O Centro, que conta com acomodações e serviços de estadia, além de um bom acervo de livros, fitas e DVDs, desenvolve também trabalhos na área social-pedagógica.
Detalhes do local e maiores informações sobre os próximos encontros podem ser feitas diretamente com a responsável pelo projeto, Prof. Rachel Fernandes, através da homepage do Centro – www.centrokrishnamurti.com.
Além disso, o Centro de Estudos está aceitando propostas de parcerias para desenvolver estas atividades de convivência como também outros projetos afins. O encaminhamento de proposições pode ser feito também através do site ou diretamente com a responsável.
Desde a criação da Ordem da Estrela do Oriente, a Sra. Emily Lutyens, Representante da mesma em Londres, e sua filha Mary Lutyens, acompanharam a vida do Sr. J. Krishnamurti, viajando com ele freqüentemente para várias partes do mundo, e puderam reunir dados a seu respeito.
Em virtude da grande amizade e confiança de Krishnamurti em relação às duas Senhoras, ele sempre lhes escrevia relatando acontecimentos íntimos. Sabia também que elas tudo registravam num Diário, para objetivos póstumos.
Além disso, receberam as informações reunidas pelo Sr. Shiva Rao, antigo membro do Parlamento indiano, que, igualmente, por longo tempo, convivera com J. Krishnamurti. Pretendia escrever a biografia dele, mas faleceu antes de cumprir seu intuito.
Com a morte da Sra. Emily Lutyens, coube à sua filha, Mary Lutyens, escrever as obras intituladas: “Krishnamurti – The Years of Awakening” (Os Anos do Despertar); “Krishnamurti – The Years of Fulfilment (Os Anos de Plenitude) e “Krishnamurti – The Open Door (A Porta Aberta).
No livro Palestras em Auckland, 1934″, diz Krishnamurti: (…) E vós vos tendes preparado (…) e não importa que eu seja o Instrutor ou não. Ninguém vô-lo pode dizer, (…) porque nenhuma outra pessoa pode sabê-lo, exceto eu próprio; e, mesmo assim, eu vos digo que isso não importa. Jamais contradisse isso, apenas digo: deixai isso de parte”. (…) (pág. 101-102)
Em “A Fonte da Sabedoria” (Palestras em Eerde, Acampamento de Ommen, Holanda, de 1926-1928), sob o epígrafe “Quem traz a Verdade”, revela Krishnamurti os encontros que teve em sua ascensão espiritual:
Quando, no entanto, eu era rapazinho, costumava ver Shri Krishna (…) tal como é desenhado pelos hindus, pois minha mãe era devota de Shri Krishna. (…) Quando, crescendo em idade, encontrei o Bispo Leadbeater e a Sociedade Teosófica, comecei a ver o Mestre K.H. e, desde então, o Mestre K.H. era para mim a finalidade.
Segue: Mais tarde ainda, e à medida que ia crescendo, comecei a ver o Senhor Maitreya (nome do Senhor Cristo na Índia). Foi isto há dois anos e via-O constantemente na forma que perante mim era colocada. (pág. 57)
Faço-vos esta narrativa, não para obter autoridade nem criar uma crença, (…). Foi para mim uma luta constante encontrar a verdade, pois não me sentia satisfeito com a autoridade de outrem. Quis por mim próprio descobrir e, naturalmente, tive de passar por sofrimentos para achar o que buscava. (pág. 57)
Ultimamente tem sido o Senhor Buddha a quem tenho visto e tem sido meu deleite e minha glória o estar com Ele. (pág. 57)
Tem-me sido perguntado o que entendo pelo “Bem Amado”. Dar-vos-ei um significado, uma explicação que interpretareis como vos aprouver. Para mim, é tudo – é Shri Krishna, é o Mestre K.H., é o Senhor Maitreya, é o Buddha e, no entanto, está para além de todas essas formas. (pág. 57)
Que importa o nome que Lhe derdes? Lutais pelo Instrutor do Mundo, por um nome? O mundo nada sabe acerca do Instrutor; alguns dentre nós, individualmente, sabem: alguns acreditam por autoridade; outros têm sua própria experiência e conhecimento próprio.(…) (pág. 57)
Disse a mim próprio: enquanto não me unificar com todos os Instrutores, que eles sejam os mesmos é coisa que não tem importância, se Shri Krishna, Cristo, o Senhor Maitreya são uma só pessoa, é coisa também sem grande conseqüência. (pág. 58)
Disse a mim mesmo: enquanto eu os vir no exterior, como em um quadro, uma coisa objetiva, estou separado, estou afastado do centro; quando, porém, tiver a capacidade, a força, quando tiver determinação, quando estiver purificado e enobrecido, então essa barreira, essa separação desaparecerá. Não fiquei satisfeito enquanto esta barreira não foi despedaçada, a separação não foi destruída. (…) (pág. 58)
Falei de vagas generalidades, que todos precisavam ouvir. Nunca disse: Eu sou o Instrutor do Mundo; agora, porém, que sinto que sou uno com o Bem Amado, eu o digo, não a fim de vos impor minha autoridade, ou para vos convencer de minha grandeza ou da grandeza do Instrutor do Mundo, nem mesmo da beleza da vida ou da simplicidade da vida, mas simplesmente para despertar o desejo em vossos corações e em vossas mentes de buscardes a Verdade. (…) (pág. 58-59)
Daí estar eu capacitado para vos dizer que sou uno com o Bem Amado – quer o interpreteis como sendo o Buddha, o Senhor Maitreya, Shri Krishna, o Cristo, ou qualquer outro nome. (pág. 59)
No panfleto “Que o Entendimento Seja Lei” (conferência em Eerde, Ommen, Holanda, 1928) diz:
“Repito que não tenho discípulos. Cada um de vós é discípulo da Verdade, desde que compreenda a Verdade e não se ponha a seguir outros indivíduos. Não tenho seguidores.
“Espero que não considereis a vós mesmos como meus seguidores, porque, se o fizerdes, estareis pervertendo e traindo a Verdade que eu defendo. (…) (pág. 4)
(…) Não há compreensão no culto das personalidades. Os rótulos que adorais carecem de significação. (…) A Verdade transcende todas as graduações, porquanto essas graduações só existem por causa das limitações humanas. (pág. 5)
(…) Eu sei o que sou; sei qual é a minha finalidade na Vida, porque sou a própria Vida, sem nome, nem limitação.
E porque sou a Vida, desejo instar-vos a adorar essa vida, não na forma que é Krishnamurti, porém a vida que reside dentro de cada um de nós. (…)” (pág. 16)
Em outro opúsculo “A Finalidade da Vida” (Conferência em Eerde, Ommen, Holanda, 1928): “Não desejo que me rendais culto; não desejo que acrediteis no que digo; não desejo que façais de mim um santuário para vosso refúgio; (…) Porque o que vedes de mim, esta personalidade, este corpo, é coisa irreal, sujeita ao declíneo perecível.” (…) (pág. 19)
Também em “A Arte da Libertação: “Pergunta: Não sois vós mesmo um guru?” Resposta: Podeis fazer de mim um guru, mas eu não o sou. Não quero ser guru, pela simples razão de que não há caminho para a verdade. (…) A verdade é uma coisa viva, e para uma coisa viva não há nenhum caminho. (…) Porque a verdade não tem caminho, para a descobrirdes tendes de ser aventuroso, estar pronto para o perigo; e pensais que um guru vos ajudará a ser aventuroso, a viver no perigo? (…) (pág. 123-124)
Entrevista de Krishnamurti em Londres, 20-06-1928 (Boletim Internacional da Estrela, de agosto de 1928): “Senhor, eu o tenho dito (…) Krishnamurti, como tal, não mais existe. Assim como o rio entra no oceano e nele se perde, assim Krishnamurti entrou naquela vida (…). Assim (…) entrou nesse Oceano da Vida e é o Instrutor, pois no momento em que se entra nessa Vida – que é cumprimento de todos os Instrutores – o indivíduo como tal cessa de existir”. (pág. 20-21)
De novo, em “Que o Entendimento seja Lei”: “Pergunta: Sois o Cristo de volta ao mundo? – Resposta: Amigo, quem julgais que eu sou? (…) Não estais interessado na Verdade; estais interessado no vaso que contém a verdade (…). Eu vos digo que possuo essa água pura; possuo o bálsamo que purifica e que cura soberanamente. E me perguntais: Quem sois? – Eu sou todas as coisas – porque sou a Vida.” (pág. 21-22)
Igualmente, em “Palestras em Auckland, 1934” – “Pergunta: Sois o Messias?
Krishnamurti: Tem isso grande importância? Esta é (…) uma das perguntas que me têm sido feitas por toda parte (…). Ora, eu jamais neguei ou afirmei ser o Messias, o Cristo que voltou; (…) Ninguém vô-lo pode dizer. Mesmo que eu o dissesse, isso seria (…) destituído de valor (…). (Palestras em Auckland, 1934, pág. 120)
Continua: “Assim, pois, (…) esforçai-vos para averiguar se o que estou dizendo é verdadeiro; (…) desembaraçar-vos-eis de toda autoridade, (…). Para os seres humanos realmente criadores, inteligentes, não pode haver autoridade. (…)” (Idem, pág. 121)
Da mesma forma, em “Novo Acesso à Vida”: “Pergunta: Como pretendeis justificar (…) que sois o Instrutor do Mundo?
Resposta: Não tenho interesse algum em justificá-lo. Não é o rótulo que importa, Senhores. O grau, o título não tem importância alguma: o que tem importância é o que sois.
Rasgai o título, pois, jogai-o na cesta de papéis, queimai-o, destruí-o, livrai-vos dele. (…)
Senhores, os títulos, sejam títulos espirituais, sejam títulos mundanos, são meios de explorar os outros. (…)” (pág. 45)
E ainda, em “Uma Nova Maneira de Viver”: “Pergunta: A S.T. anunciou que vós sois o Messias e o Instrutor do Mundo. Por que deixastes a S.T. e renunciastes ao título de Messias?
Krishnamurti: Agora, com relação ao título de Messias, a questão é muito mais simples. Eu nunca o neguei, e acho que não tem muita importância se o fiz ou não. O que para vós deve importar é se o que digo é ou não a verdade.”
Segue: “Portanto, não vos deixeis levar pelo rótulo, (…). Se eu sou o Instrutor do Mundo ou o Messias, ou o quer que seja, isso não tem importância nenhuma. Se o achais importante, perdereis então a verdade do que estou dizendo, porque estais julgando pelo rótulo. (…) Um dirá que sou o Messias, outro dirá que não sou, e onde ficais? (…)” (pág. 149)
Por fim, em “Palestras na Itália e Noruega”, 1933. “Pergunta: Foi dito que sois a manifestação do Cristo em nossos dias. Que tendes a dizer sobre isto?
Krishnamurti: Meus amigos, por que fazeis semelhante pergunta? (…) Perguntais porque quereis (…) julgar o que digo de conformidade com o padrão que possuís. (…) Isto é de mui pequena importância e, além disso, como poderíeis saber o que sou ou quem sou, mesmo que eu vô-lo dissesse? (…)” (pág. 66)
Continua: “Desejais saber quem sou em virtude de estardes incertos (…). Não estou afirmando ser ou não o Cristo. (…) para mim a pergunta carece de importância. O que é importante é saberdes se o que digo é verdadeiro; ( … )” (pág. 66-67)
Segundo informações constantes da obra “Krishnamurti – Os Anos do Despertar”, de Mary Lutyens (Ed. Cultrix, S.Paulo, 1978), teria o Mestre Universal começado a manifestar-se em Krishnamurti por ocasião de reuniões importantes, com a presença de grande público, nos anos de 1925, 1926, 1927. (pág. 226, 227, 242, 278, 280).
À página 221, inicia a autora o capítulo “A Primeira Manifestação”. Trata do Congresso da Estrela, na Índia, que teve lugar em Adyar, Índia, em 28-12-1925. (No artigo “Uma Explicação”, de Annie Besant, publicado em “O Teosofista” nº 155, de março de 1927, são confirmados os aparecimentos acima, e é informado que o Congresso da Estrela, de 1925, teve a presença de 7.000 pessoas).
No certame, estava Krishnamurti no final do discurso quando, referindo-se ao Mestre universal, disse:
“Ele só vem para os que querem, que desejam, que anseiam (…)”; e, de súbito, sua voz se modificou completamente e soou: “Eu venho para os que querem simpatia, os que desejam felicidade, os que anseiam libertar-se (…). Venho para reformar e não para destruir, não venho demolir, senão construir.”
Registra Mary Lutyens que muitos notaram não só a alteração para a primeira pessoa, como uma diferença de voz. A Sra. Annie Besant, Leadbeater e Raja (Jinarâjadâsa) tiveram perfeita consciência da mudança. Na reunião final do congresso, teria a Sra. Besant declarado:
“(…) Este acontecimento (de 28 de dezembro) marcou a consagração definitiva do veículo escolhido (…) a aceitação final do corpo eleito há muito tempo (…). O advento começou (…)” (pág. 226-227)
Igualmente, no livro “Krishnamurti – Los Años de Plenitud” (Ed. Edhasa, Barcelona, 1984) se lê que, em 1927, escrevia Krishnamurti ao Sr. C.W. Leadbeater: “Eu conheço meu destino e meu trabalho. Sei com certeza, e com meu próprio conhecimento, que me estou fundindo na consciência do Mestre, e que Ele há de encher plenamente meu ser”. (pág. 14)
Nessa mesma fonte (“Los Años de Plenitud”) consta que a Sra. Besant, então acompanhada de Krishnamurti, teria feito declaração à Imprensa, nos E.U.A, assim concluindo:
“O Instrutor do Mundo está aqui” (pág. 14). Nas páginas 3, 12, 15, 249 desse livro, é repetida a 1ª manifestação do Instrutor universal em 28-12-1925, e outras em 1926 e 1927.
Ambas as obras acima fazem constantes referências a um “processo” de adaptação física, psíquica e espiritual, a que teria estado submetido Krishnamurti durante toda a sua vida. “Os Anos do Despertar”, pág. 169, 174-191; “Los Años de Plenitud”, pág. 8, 36, 37, 73, 119, 121-126, 150, 184, 255. O “processo” consta igualmente do “Diário” de Krishnamurti, vol. I e II.
Em algumas sessões do “processo”, e mesmo em outras ocasiões, foi revelada a presença, quer dos Senhores Maitreya e Buddha, quer do Mestre K.H. Dos textos, deduz-se que o processo tinha como objetivo não só a evolução individual de Krishnamurti, como a adaptação de seus veículos para a fusão de sua consciência com a do Senhor.
Verifica-se isso também em: “Os Anos do Despertar”, pág. 48, 160-167, 179-181, 189, 196-197, 209, 225-227, 242, 250-251, 255-256); “Os Anos de Plenitude”, pág. 12-13, 121, 125-126, 243, 245, 253).
Nesta noite, vamos percorrer um longo caminho. Ontem estivemos tratando do sofrimento e do findar do sofrimento. Quando o sofrimento chega ao fim, há paixão. Pouquíssimos de nós realmente compreendem a questão do sofrimento ou nela penetram profundamente. Será possível liquidar, de vez, o sofrimento? Todos os seres humanos têm feito essa pergunta, embora, talvez, não muito conscientemente, mas, no fundo, todos querem saber se a dor e o sofrimento humano podem acabar. Enquanto o sofrimento não termina, não pode haver amor.
O sofrimento é um violento golpe no sistema nervoso, como um soco no corpo e na psique. E geralmente tentamos escapar dele através de drogas, bebida, movimentos religiosos – ou, então, acabamos cínicos ou passamos a aceitar as coisas como inevitáveis.
Será que podemos investigar, a fundo e com seriedade, se é possível ficar com o problema sem fugir dele? Suponhamos que perca meu filho e, sofrendo com isso um grande choque, experimentando uma dor imensa, descubra que sou um ser humano extremamente solitário. Não consigo encarar nem suportar a situação e, por isso, fujo dela. Há inúmeras formas de fuga – religiosas, mundanas ou filosóficas. Mas será que posso permanecer com o que aconteceu, com essa coisa chamada sofrimento, sem procurar, de modo algum, fugir da dor, da angústia, da solidão, da aflição, do abalo? Será que podemos observar um problema, observá-lo apenas, sem procurar resolvê-lo, olhar para ele como se fosse uma jóia preciosa, de fino acabamento? Para uma coisa bonita olhamos sem parar, sem qualquer desejo de fugir dela; sua beleza nos atrai tanto e tanto prazer nos proporciona que ficamos olhando para ela o tempo todo. Se, da mesma forma, pudermos observar nosso sofrimento, sem um movimento sequer de julgamento ou fuga, ficar com a tristeza… nesse caso, a própria ação de ficar com o fato nos liberta completamente daquilo que produziu a dor. Voltaremos a isso depois.
Desejamos também considerar o que é a beleza – não a beleza de uma pessoa nem de quadros e estátuas de museus, nem os mais remotos esforços do homem para transmitir seus sentimentos através da pedra, da pintura ou de um poema, mas indagar a nós mesmos o que é a beleza. Talvez a beleza seja a verdade. Talvez seja o amor. Sem compreendermos a natureza e a profundidade dessa coisa extraordinária que é a beleza, jamais chegaremos ao que é sagrado. Examinemos, portanto, a questão da beleza.
O que acontece quando vemos algo grandioso como a montanha coberta de neve contra o céu azul? Por um segundo a majestade da montanha, com sua imensidão, com seu belo recorte contra o céu azul apaga toda nossa preocupação com nós mesmos. Nesse segundo, não há “ninguém” a olhar. Por um segundo, a grandiosidade da montanha afasta todo sentimento egocêntrico do nosso viver. Certamente que já devem ter notado isso. Já observaram uma criança com um brinquedo? Durante o dia inteiro ela fez travessuras (o que é normal), e então damos um brinquedo a ela. Agora, por um bom tempo, até que escangalhe o brinquedo, ela permanece tranqüila; o brinquedo dissipou sua agitação, absorveu-a. Assim também quando vemos algo extremamente belo – a beleza nos absorve? Significa isso que só há beleza quando cessa a luta do eu, quando não existe mais egocentrismo. Compreendem isso? Se não ficamos absorvidos nem impressionados por algo muito belo, como uma montanha ou um vale cheio de sombras; se não somos arrebatados pela montanha, podemos compreender a beleza sem o ego? Quando o eu está presente, não há beleza; quando existe egocentrismo, não há amor; e o amor e a beleza estão sempre juntos – não são duas coisas separadas.
Temos de tratar também da morte. Isso é uma coisa que todos precisamos encarar. Sejamos ricos ou pobres, ignorantes ou eruditos, jovens ou velhos, a morte é inevitável para todos nós; todos vamos morrer. E nunca fomos capazes de compreender a natureza da morte; estamos sempre com medo de morrer, não estamos? Para compreender a morte temos de indagar o que é o viver, o que é a nossa vida, pois estamos desperdiçando a nossa vida, estamos desperdiçando nossas energias de muitas maneiras, nas muitas profissões especializadas. Pode ser que sejam ricos, muito competentes, que sejam especialistas, um grande cientista ou um homem de negócios; pode ser que tenham poder, posição, mas, no fim da vida, será que tudo isso não foi um desperdício? Toda essa lida, sofrimento, essa enorme ansiedade e insegurança, as tolas ilusões que o homem acumulou (deuses, santos, etc.), não será tudo isso um desperdício? Por favor, essa é uma pergunta séria, que cada um tem de fazer a si próprio. Ninguém pode responder por nós. Costumamos separar o viver do morrer. A morte fica lá no fim da vida; nós a colocamos o mais longe possível – depois de muito tempo. Mas, ainda que seja uma longa jornada, temos de morrer. E o que é isso a que chamamos viver – ganhar dinheiro, ir ao escritório das nove às cinco? E com isso sofremos interminável conflito, temor, ansiedade, solidão, desesperança, depressão. Mas será que toda essa existência a que chamamos vida, viver (essa imensa vicissitude do homem com seu conflito sem fim, decepção, degradação) – será isso viver? Mas é a isso que chamamos viver; é isso que conhecemos, é como isso que estamos familiarizados, essa é a nossa existência diária. E a morte significa o fim de tudo, o findar de tudo que pensamos, acumulamos e gozamos. E vivemos apegados a tais coisas. Estamos apegados à família, ao dinheiro, aos conhecimentos, às crenças com as quais temos convivido, aos ideais. Estamos apegados a tudo isso. E a morte vem e diz: “Esse é o fim de tudo, meu velho”.
Tememos morrer, isto é, deixar tudo que conhecemos, tudo que experimentamos, reunimos – nossa encantadora mobília e a bela coleção de quadros de pintura. A morte chega e diz: “Nada mais lhe pertence.” É por isso que nos apegamos ao conhecido e tememos o desconhecido. Podemos inventar a reencarnação, que devemos renascer numa próxima vida. Mas nunca indagamos o que nasce na vida seguinte. O que renasce é um feixe de memórias.
A pergunta, portanto, é esta: por que o cérebro separou o viver (que é conflito e tudo o mais) do morrer? Por que essa divisão? Existe essa divisão quando há apego? Podemos viver no mundo moderno com a morte? Não estamos falando de suicídio, mas em acabar com o apego (e isso é a morte) enquanto vivemos. Estou apegado à casa em que vivo – comprei a casa por um bom dinheiro e apego-me ao mobiliário, aos quadros, à família, a todas essas memórias. Então chega a morte e acaba com tudo. Mas será que podemos conviver diariamente com a morte, dando um fim a tudo no fim de cada dia, eliminando todo nosso apego? Isso é o que significa morrer. Como costumamos separar o viver do morrer, estamos sempre com medo. Quando levamos juntos, contudo, a vida e a morte, o viver e o morrer, então descobrimos que há um estado cerebral em que cessa todo conhecimento como memória.
Precisamos do conhecimento para escrever uma carta, vir até aqui, falar inglês, fazer a contabilidade, ir para casa etc. Mas será que podemos usar o conhecimento sem sobrecarregar a mente? Poderá o cérebro usar o conhecimento quando necessário, mas estar livre de todo conhecimento? Nosso cérebro está sempre registrando; agora mesmo estão registrando o que se está dizendo. O registro torna-se memória e a memória, nesse registro, é necessária em certo domínio, no domínio da atividade física. Por conseguinte, pode o cérebro usar o conhecimento quando necessário mas estar livre do velho conhecimento? Pode o cérebro estar livre para funcionar perfeitamente noutra dimensão? Todos os dias, portanto, quando forem dormir, eliminem tudo que acumularam; morram no fim do dia.
E então ouvimos uma declaração como esta: viver é morrer; viver e morrer não são duas coisas diferentes. Se não ouvirem essa declaração com os ouvidos apenas, se estiverem escutando com muita atenção, perceberão a verdade do fato, perceberão a realidade. E, imediatamente, verão como isso é claro. Assim, será que, no fim do dia, podemos morrer para tudo que não for necessário? Morrer para a lembrança de nossas mágoas, nossas crenças, temores, ansiedades, infortúnios – será que podemos pôr fim a tudo isso diariamente? E aí descobrimos que estamos vivendo com a morte o tempo todo, pois a morte é o fim.
Precisamos, de fato, investigar essa questão do findar. Nunca terminamos, definitivamente, coisa alguma; só quando conseguimos alguma vantagem com isso, alguma recompensa. Mas, será que podemos viver assim no mundo de hoje – liquidando tudo voluntariamente, sem pensar no futuro, sem esperar por algo “melhor”, ter, portanto, uma maneira holística de viver, vivendo e morrendo a cada momento? Estamos tratando juntos de coisas que o homem se vem ocupando há um milhão de anos – o viver e o morrer. Temos, portanto, de examinarmos juntos o problema e não reagir a ele, dizendo: “É, mas eu creio na reencarnação” – pois, nesse caso, termina o diálogo entre nós.
Estamos apegados a um mundo de coisas – ao nosso guru, ao conhecimento acumulado, ao dinheiro, às crenças com que temos vivido, aos ideais, à memória de nosso filho ou filha e por aí afora. Nós somos a memória. Nosso cérebro é todo memória – não somente a memória dos conhecimentos recentes mas também a dos remotos, a memória profunda que conserva o que foi o animal, o macaco. Fazemos parte dessa memória e estamos apegados a toda essa consciência. Certo? Isso é um fato. Aí chega a morte e diz: “Acabou o seu apego.” E nós tememos tal coisa, tememos ficar completamente libertos disso tudo. A morte, no entanto, retira de nós tudo que adquirimos. Podemos inventar e dizer: “Sim, mas eu continuo na próxima vida.” Mas o que é que continua? Compreendem a pergunta? Que significa o desejo de continuar? Haverá alguma espécie de continuidade a não ser a da sua conta bancária, ir diariamente ao escritório, a rotina do culto e a continuidade das crenças – tudo que o pensamento criou?
O pensamento é limitado e, assim, cria conflito – já vimos isso. E o eu, o ego, a persona é um complicado feixe de memórias, antigas e recentes. Vivemos de memórias. Vivemos do conhecimento, adquirido ou herdado; somos o produto do conhecimento. O eu é o conhecimento resultante das experiências passadas, dos pensamentos etc. Isso é que é o eu. O eu pode inventar que há algo divino em nós; mas isso ainda é atividade do pensamento. E o pensamento é sempre limitado. Podem ver isso por si mesmos; não precisam ler livros nem estudar as filosofias; podem perceber claramente por si próprios que são um feixe de memórias. E a morte põe fim a toda memória. Eis porque ficamos atemorizados. A questão, portanto, é esta: podemos conviver com a morte no mundo moderno?
Agora devemos também examinar juntos o que é o amor. Será que o amor é sensação? Será desejo? Será prazer? Será coisa criada pelo pensamento? Será que amam a esposa ou o marido ou os filhos? Será que o amor é ciúme? Não digam que não. Será que o amor é medo, ansiedade, sofrimento e tudo mais? O que é o amor? E sem esse quê, esse perfume, essa chama (ainda que sejam ricos, tenham poder, posição, importância) sem amor, serão apenas uma concha vazia. Precisamos, por conseguinte, aprofundar essa questão do amor. Se amassem seus filhos, haveria guerras? Se amassem seus filhos, permitiriam que eles matassem outros? Pode haver amor quando existe ambição? Por favor, enfrentem tudo isso. Mas não conseguimos porque estamos presos a uma rotina, à sensação repetida de sexo etc.
O amor nada tem que ver com prazer, com sensação. O amor não provém do pensamento; não faz parte, por isso, da estrutura do cérebro. É algo que está completamente fora do cérebro, pois o cérebro, por sua própria natureza, é instrumento da sensação, das reações nervosas etc. Quando há sensação, não existe amor. O amor não é coisa da memória.
E temos que discutir sobre a vida religiosa e a religião. Essa é uma questão muito complexa. Os seres humanos vêm buscando alguma coisa que esteja além do mundo físico, além da existência diária do sofrimento, dor ou prazer. Têm buscado algo transcendente, primeiro nas nuvens, sendo o trovão a voz de deus. Depois, cultuaram árvores, pedras – e os aldeões que vivem longe desta feia e detestável cidade ainda veneram pedras, árvores, pequenas imagens. O homem deseja saber se existe alguma coisa sagrada e, então, chega o sacerdote e diz: “Vou-lhe mostrar” – é exatamente o que faz o guru. Os sacerdotes do Ocidente possuem seus rituais, frases de repetição, roupas ornamentadas e o culto a imagens. E os daqui também têm suas próprias imagens. Há os que não acreditam em nada disso; são ateus e se dizem humanitaristas. Mas os que ouvem a este que fala querem descobrir se há algo fora do tempo, além do pensamento. Vamos, portanto, investigar juntos, exercitar nosso cérebro, nossa razão, nossa lógica para averiguar o que é religião, o que é vida religiosa e se é possível viver uma vida religiosa neste mundo moderno.
Investiguemos, por conseguinte, para descobrir o que, de fato e verdadeiramente, é a vida religiosa. E só podemos descobrir isso quando compreendemos o que são as religiões e as descartamos totalmente – não quando pertencemos a uma religião, a uma organização, um guru ou determinada autoridade que se diz espiritual. Não há autoridades espirituais; esse é um dos crimes que cometemos: inventar um mediador entre nós e a verdade.
Quando indagamos o que é religião, nessa própria indagação já estamos vivendo religiosamente; não no fim dela. No processo mesmo de olhar, observar, discutir, duvidar, objetar, não ter crença nem fé, nessa própria investigação já estamos levando uma vida religiosa. Vamos fazer isso agora.
Tratando-se de assunto religioso, parece que perdem a razão, a lógica, o bom senso. Precisamos, portanto, ser lógicos, racionais, descrentes, indagadores em relação a tudo que o homem criou – deuses, salvadores, gurus e toda sua autoridade; precisamos eliminar, completamente, tudo isso. Nada disso é religião; é apenas a autoridade que alguns poucos assumem. Nós é que lhes conferimos autoridade.
Já notaram que, sempre que há desordem social e política nas relações humanas, aparece um déspota, um ditador? Temos recentes exemplos disso. Sempre que há desordem em nossa vida, criamos uma autoridade; somos responsáveis pela autoridade e existem pessoas prontas a aceitar essa autoridade. Sempre que há medo, inevitavelmente o homem procura um meio de se proteger, de se manter em segurança, uma vez que ele se sente atemorizado. E é por causa desse medo que inventamos deuses. Por causa desse medo é que inventamos os rituais e todo esse circo a que damos o nome de religião. Todos os templos neste país, todas as igrejas e mesquitas, tudo isso foi o pensamento que criou. Podem afirmar que há uma revelação sem jamais duvidarem de tal coisa. Mas ponham em dúvida essa revelação. Acontece que aceitam; se usarem, contudo, a lógica, a razão, o bom senso, perceberão como acumulam superstições – e nada disso, obviamente, é religião. Será que podem descartar tudo isso para descobrir a essência da religião, qual é a mente, o cérebro, capaz de viver religiosamente? Será que podem, como seres humanos cheios de temor, viver sem inventar nada, sem criar ilusões, e enfrentar o medo? O medo psicológico pode desaparecer completamente quando ficamos com ele, sem fugir dele, dando a ele total atenção. É como lançar um jato de luz sobre o medo, um forte jorro de luz; o medo se extingue por completo. E, quando não há medo, já não há mais deuses, já não mais rituais, pois tudo isso se torna desnecessário, estúpido. As coisas que o pensamento inventa nada têm que ver com religião, pois o pensamento não passa de um processo material resultante da experiência, do conhecimento e da memória. É o pensamento que inventa todo o palavrório e estrutura das religiões organizadas, que já perderam totalmente a significação. Será que, voluntariamente, podem rejeitar tudo isso sem esperar por uma recompensa? Será que querem fazer isso? Se fizerem, então ninguém mais perguntará o que é religião.
E haverá alguma coisa que ultrapasse o tempo e o pensamento? Podem fazer essa pergunta mas, se o pensamento inventar que existe algo transcendente, isso ainda constitui um processo material. O pensamento é um processo material que acumula o conhecimento nas células cerebrais. O orador não é cientista, mas podem ver isso em si mesmos, podem observar em seu próprio cérebro a atividade do pensamento. Desse modo, se puderem desfazer-se de tudo isso voluntariamente, sem oposição nem resistência, nesse caso, inevitavelmente, indagarão: existirá algo que esteja além do tempo e do espaço? Haverá algo jamais visto antes por qualquer outro homem? Haverá algo imensamente sagrado? Haverá algo jamais tocado pelo cérebro? E é isso que vamos descobrir, se é que já deram o primeiro passo, o de varrer completamente toda essa baboseira chamada religião. Quando usam o cérebro e a lógica, podem duvidar, indagar.
Assim, o que significa a meditação que faz parte da religião? O que é meditação? Será fugir do tumulto, ter uma mente silenciosa, uma mente tranqüila e pacífica? E, para ficarem atentos, para manterem os pensamentos sob controle, praticam um sistema, um método, um processo. Sentam-se de pernas cruzadas e repetem um mantra qualquer. Disseram-me que essa palavra, etimologicamente, significa “ponderar”, “não vir a ser”, “absorver”, “eliminar toda atividade egocêntrica”. Mas nós repetimos, repetimos, repetimos e continuamos vivendo egocentricamente, egoisticamente, pois mantra perdeu o significado.
O que é, pois, meditação? Será um esforço consciente? Costumamos meditar conscientemente, praticar a fim de conseguir alguma coisa – uma mente ou um cérebro tranqüilo, um estímulo para o cérebro. Mas qual é a diferença entre esse meditador e o homem que diz “Quero dinheiro e vou trabalhar para obtê-lo?” Qual é a diferença entre os dois? Ambos estão buscando alguma coisa. Só que a busca de um classificamos de espiritual e a do outro, de mundana. Não obstante, ambos estão buscando algo. Assim, para o orador, isso não é meditação; meditação nada tem que ver com qualquer desejo consciente e deliberado como produto da vontade.
Precisamos indagar, portanto, se há alguma espécie de meditação que não seja produzida pelo pensamento. Haverá alguma espécie de meditação da qual não estejamos consciente? Compreendem isso? Nenhum processo deliberado de meditação é meditação. Isso é tão claro! Podem sentar-se de pernas cruzadas pelo resto da vida, meditar, respirar e praticar tudo mais sem que cheguem sequer perto da outra coisa, pois isso não passa de uma ação intencional para conseguir um resultado – causa e efeito. Mas o efeito torna-se a causa e, assim, acabam presos num círculo. Haverá uma espécie de meditação que não resulte do desejo, da vontade, do esforço? O orador afirma que há. Mas não precisam acreditar nisso; pelo contrário, devem duvidar, indagar, assim como o orador indagou, duvidou, rejeitou. Haverá uma espécie de meditação não planejada nem organizada? Para examinar isso, precisamos compreender o cérebro condicionado, o cérebro limitado, o cérebro que tenta alcançar o ilimitado, o imensurável, o atemporal, se é que existe esse atemporal. E, para isso, é necessário compreender o som. Som e silêncio são inseparáveis.
Costumamos separar o som do silêncio. O som é o mundo; o som é a batida do coração; o universo está repleto de sons; os céus, as milhares de estrelas, todo o firmamento está cheio de som. E consideramos o som uma coisa intolerável. Mas, quando escutamos o som, o próprio ato de escutar é silêncio. O silêncio não se separa do som. A meditação, portanto, não é algo planejado, organizado. A meditação apenas é. Começa com o primeiro passo que é o estar livre de todos os ressentimentos, livre de tudo que já acumulamos – temores, ansiedades, solidão, desespero, sofrimento. Essa é a base, o primeiro passo e o primeiro passo é o último passo. Se derem o primeiro passo, termina tudo. Mas não estamos com vontade de dar esse primeiro passo porque não queremos ser livres. Queremos depender – do poder, de pessoas, do meio-ambiente, de nossa experiência, do conhecimento. Nunca nos libertamos da dependência, do medo.
No findar do sofrimento está o amor. E nesse amor há compaixão. A compaixão tem sua própria inteligência. E quando age a inteligência, atua a própria verdade. Quando essa inteligência está presente, não há conflito. De tudo já ouviram falar – da cessação do medo, do findar do sofrimento, da beleza e do amor. Mas uma coisa é ouvir, e outra, agir. Ouvem tudo isso (que é verdadeiro, lógico, sensato, racional) mas não agem de acordo com isso. Vão para casa e começa tudo de novo – as preocupações, os conflitos, toda a miséria. Assim, perguntamos: qual é a finalidade de tudo isso? Que adianta ouvir este orador e não viver o que ele diz? Quando ouvimos e não agimos, desperdiçamos nossa vida; se ouvirem algo verdadeiro e não agirem, estarão desperdiçando a vida. E a vida é algo muitíssimo precioso – é a única coisa que temos. E acontece que perdemos também contato com a natureza, o que significa que perdemos contato com nós mesmos, parte que somos da natureza. Não amamos as árvores nem os pássaros nem as águas nem as montanhas. Estamos a nos destruir uns aos outros. E tudo isso é desperdício de vida.
Quando percebemos toda essa coisa não apenas intelectualmente nem verbalmente, então vivemos uma vida religiosa. Botar uma tanga, tornar-se pedinte ou entrar para um mosteiro, nada disso é vida religiosa. A vida religiosa começa quando cessa o conflito, quando existe amor. Podemos amar uma pessoa (esposa ou marido), mas aquele amor é para todos os seres humanos, não se destina a uma só pessoa, não é restritivo. Portanto, se empenharem coração, mente e cérebro haverá algo que transcende o tempo. E aí estará a bênção – não nos templos, nas igrejas nem mesquitas. Essa bênção estará onde estivermos.
Krishnamurti. Bombaim. 10/02/1985. K. F. Bulletin 54 (1988) – Carta de Notícias. Janeiro-Dezembro 1991. ICK.
DA INTELIGÊNCIA
Tradução: Daniel Guimarães
Pensamento é da ordem do tempo; inteligência é de uma ordem, de uma qualidade diferente; Está a inteligência ligada ao pensamento? Cérebro, o instrumento da inteligência; pensamento como um ponteiro. O pensamento, e não a inteligência, domina o mundo. O problema do pensamento e do despertar da inteligência. Inteligência operando num contexto limitado pode servir a propósitos altamente não-inteligentes. Matéria, pensamento, inteligência têm uma fonte comum, são uma energia; por que se dividiram? Segurança e sobrevivência: o pensamento não pode considerar a morte de modo apropriado. “Pode a mente manter a pureza de sua fonte original?” O problema do aquietar do pensamento. Insight, a percepção do todo, é necessário. Comunicação sem a interferência da mente consciente.
Professor Bohm:1 Com relação à inteligência, eu sempre gosto de pesquisar a origem da palavra, bem como seu significado. É muito interessante; Inteligência vem de inter e legere, o que significa “ler entre”. Então me parece que se poderia dizer que o pensamento é como a informação num livro e que a inteligência tem que lê-la, ler seu significado. Acho que isso dá uma noção melhor do que seja inteligência.
Krishnamurti: Ler nas entrelinhas.
Bohm: Sim, depreender o significado. Há também um sentido relevante dado no dicionário, que é: estado de alerta mental.
Krishnamurti: Sim, alerta mental.
Bohm: Bem, isso é bastante diferente daquilo que as pessoas têm em mente quando medem inteligência. Agora, considerando muitas das coisas que você tem dito, você diria que inteligência não é pensamento. Você diz que o pensamento tem seu lugar no cérebro antigo, que é um processo físico, eletromecânico; tem sido amplamente provado pela ciência que todo pensamento é essencialmente um processo físico, químico. Então talvez pudéssemos dizer que a inteligência não é da mesma ordem, que ela não é da ordem do tempo, de todo.
Krishnamurti: Inteligência.
Bohm: Sim, a inteligência lê “nas entrelinhas” do pensamento, vê o significado dele. Há um outro ponto antes de começarmos essa questão: se você diz que o pensamento é físico, então a mente, ou a inteligência, ou como quer que queira chamar isso, parece diferente, é de uma ordem diferente. Você diria que há uma diferença real entre o físico e a inteligência?
Krishnamurti: Sim. Estamos dizendo que o pensamento é matéria? Coloquemos isto de forma diferente.
Bohm: Matéria? Em vez disso, eu diria processo material.
Krishnamurti: Tudo bem; o pensamento é um processo material, e qual é a relação entre ele e a inteligência? É a inteligência um produto do pensamento?
Bohm: Acho que podemos estar certos de que não é.
Krishnamurti: Por que estamos certos?
Bohm: Simplesmente porque o pensamento é mecânico.
Krishnamurti: O pensamento é mecânico, isso está correto.
Bohm: A inteligência, não.
Krishnamurti: Então o pensamento é mensurável; a inteligência não. E como acontece de essa inteligência vir a existir? Se o pensamento não possui relação com a inteligência, então, é a cessação do pensamento o despertar da inteligência? Ou o que ocorre é que a inteligência, sendo independente do pensamento, e não sendo do tempo, existiu sempre?
Bohm: Isso levanta muitas questões difíceis.
Krishnamurti: Eu sei.
Bohm: Eu gostaria de dispor essa questão numa estrutura de pensamento que se pudesse conectar a quaisquer pontos de vista científicos que possam existir.
Krishnamurti: Sim.
Bohm: Até para mostrar que ela é cabível ou que não é. Então você diz que a inteligência pode ter existido eternamente.
Krishnamurti: Eu estou perguntando – ela existe eternamente?
Bohm: Pode ser que sim e pode ser que não. Ou é possível que algo interfira com a inteligência?
Krishnamurti: Veja, os Hindus têm a teoria de que a inteligência, ou Brahman, existe eternamente e que é coberta pela ilusão, pela matéria, pela estupidez, por todos os tipos de coisas errôneas criadas pelo pensamento. Eu não sei se você iria tão longe assim.
Bohm: Bem, sim; nós não percebemos, de fato, a existência eterna da inteligência.
Krishnamurti: Eles dizem deixe tudo isso de lado, aquela coisa existe. Então, seu pressuposto é de que ela tenha existido eternamente.
Bohm: Há uma dificuldade nisso, na palavra “eternamente”.
Krishnamurti: Sim.
Bohm: Porque “eternamente” implica tempo.
Krishnamurti: Correto.
Bohm: E esse é exatamente o problema. Tempo é pensamento – eu gostaria de colocar assim: que o pensamento é da ordem do tempo – ou talvez seja o inverso – que o tempo é da ordem do pensamento. Em outras palavras, o pensamento inventou o tempo, e na verdade o pensamento é tempo. Da forma que eu vejo, o pensamento pode varrer todo o tempo em um momento; mas então o pensamento está sempre mudando sem notar que está mudando fisicamente – por razões físicas, é isso.
Krishnamurti: Sim.
Bohm: Não razões racionais.
Krishnamurti: Não.
Bohm: As razões não têm a ver com alguma coisa total, mas sim com algum movimento físico do cérebro; portanto…
Krishnamurti: …elas dependem do ambiente e de todo tipo de coisas.
Bohm: Então como o pensamento muda com o tempo, seu significado não é mais consistente, torna-se contraditório, muda de um modo arbitrário.
Krishnamurti: Sim, estou acompanhando.
Bohm: Então você começa a pensar: tudo está mudando, todas as coisas mudam, e você compreende “eu estou no tempo”. Quando o tempo é estendido, se torna vasto, o passado antes de eu existir, mais e mais atrás e também adiante, no futuro, então você começa a dizer que o tempo é a essência de tudo, que o tempo domina tudo. No início, a criança pode pensar “eu sou eterna”; então, começa a entender que faz parte do tempo. A visão geral com que nos identificamos é de que o tempo é a essência da existência. Eu acho que este não é apenas o senso comum, mas a visão científica também. É muito difícil abandonar tal visão porque é um condicionamento intenso. É mais forte, inclusive, do que o condicionamento do observador e da coisa observada.
Krishnamurti: Sim, com efeito. Estamos dizendo que o pensamento é do tempo, que o pensamento é mensurável, que pode mudar, se modificar, se expandir? E a inteligência é de uma qualidade inteiramente diferente?
Bohm: Sim, de ordem diferente, de qualidade diferente. E eu tenho uma impressão interessante desse pensamento com relação ao tempo. Se pensarmos no passado e no futuro, pensamos que o passado está se tornando o futuro; mas pode-se perceber que tal não pode ser, que isso é apenas pensamento. Ainda se tem a impressão de que passado e futuro estão presentes juntos e há movimento de outra forma; que todo o padrão está se movendo.
Krishnamurti: Todo o padrão está se movendo.
Bohm: Mas eu não posso visualizar como ele se move. Num certo sentido, está se movendo numa direção perpendicular à direção entre passado e futuro. Todo esse movimento – então eu começo a achar que o movimento está em outro tempo.
Krishnamurti: Com efeito.
Bohm: Mas isso traz de volta ao paradoxo.
Krishnamurti: Sim, é isso. Está a inteligência fora do tempo e portanto não relacionada ao pensamento, que é um movimento do tempo?
Bohm: Mas o pensamento tem de estar relacionado a ela.
Krishnamurti: Ele está? Estou perguntando. Eu penso que não.
Bohm: Não? Mas parece haver alguma relação no sentido de que se distingue entre um pensamento inteligente e um pensamento não-inteligente.
Krishnamurti: Sim, mas isso requer inteligência: reconhecer o pensamento não-inteligente.
Bohm: Mas quando a inteligência lê o pensamento, qual é a relação?
Krishnamurti: Vamos devagar…
Bohm: E o pensamento responde à inteligência? O pensamento não se modifica?
Krishnamurti: Sejamos simples. O pensamento é tempo. É movimento no tempo. O pensamento é mensurável e funciona no campo do tempo, todo se movendo, modificando, transformando. Está a inteligência dentro do campo do tempo?
Bohm: Bem, vimos que de certa maneira não pode estar. Mas a coisa não está clara. Primeiro de tudo, o pensamento é mecânico.
Krishnamurti: O pensamento é mecânico, isso está claro.
Bohm: Segundo, de certa maneira, há um movimento que é de uma direção diferente.
Krishnamurti: O pensamento é mecânico; sendo mecânico, pode se mover em direções diferentes e tudo o mais. É a inteligência mecânica? Coloquemos dessa forma.
Bohm: Eu gostaria de perguntar o que significa ser mecânico.
Krishnamurti: Está certo: ser repetitivo, mensurável, comparável.
Bohm: Eu diria também dependente.
Krishnamurti: Dependente, sim.
Bohm: A inteligência – coloquemos claramente – não pode ser dependente de condições para sua validade. No entanto, parece que, de certa maneira, ela não opera se o cérebro não estiver saudável.
Krishnamurti: Obviamente.
Bohm: Nesse aspecto, a inteligência parece depender do cérebro.
Krishnamurti: Ou seria a inteligência a quietude do cérebro?
Bohm: Tudo bem, ela depende da quietude do cérebro.
Krishnamurti: Não da atividade do cérebro.
Bohm: Ainda há alguma relação entre a inteligência e o cérebro. Nós, certa vez, discutimos essa questão, há muitos anos atrás, quando eu mencionei a idéia de que, na física, poder-se-ia utilizar um instrumento de medição de duas formas, a positiva e a negativa. Por exemplo, pode-se medir uma corrente elétrica pela oscilação da agulha no instrumento, ou pode-se usar o mesmo instrumento naquilo que é chamado de ponte Wheatstone, onde a leitura pela qual se procura é uma leitura nula; uma leitura nula indica harmonia, equilíbrio entre os dois lados do sistema como um todo. Então, caso se esteja utilizando o instrumento negativamente, então seu não-movimento é o sinal de que está funcionando adequadamente. Poderíamos dizer que o cérebro pode ter usado o pensamento positivamente para fazer uma imagem do mundo…
Krishnamurti: … o que é uma função do pensamento – uma das funções.
Bohm: A outra função do pensamento é negativa, que é, através de seu movimento, indicar desarmonia.
Krishnamurti: Sim, desarmonia. Prossigamos daqui. É a inteligência dependente do cérebro – chegamos a esse ponto? Ou quando usamos a palavra “dependente” o que queremos dizer?
Bohm: Ela tem muitos significados possíveis. Pode ser simples dependência mecânica. Mas há um outro tipo: que um não pode existir sem o outro. Se eu digo “Eu dependo de comida para existir”, isso não significa que tudo que penso é determinado pelo que eu como.
Krishnamurti: Sim, de fato.
Bohm: Então eu proponho que a inteligência depende, para sua existência, desse cérebro, que pode indicar desarmonia, mas o cérebro não tem nada a ver com o conteúdo da inteligência.
Krishnamurti: Então, se o cérebro não estiver harmonioso, a inteligência pode funcionar?
Bohm: Essa é a questão.
Krishnamurti: Isso é o que estamos dizendo. Ela não pode funcionar se o cérebro estiver ferido.
Bohm: Se a inteligência não funciona, há inteligência? Portanto, parece que a inteligência requer o cérebro para que exista.
Krishnamurti: Mas o cérebro é apenas um instrumento.
Bohm: Que indica harmonia ou desarmonia.
Krishnamurti: Mas não é o criador da inteligência.
Bohm: Não.
Krishnamurti: Entremos nisso devagar.
Bohm: O cérebro não cria a inteligência, mas é um instrumento que auxilia a inteligência a funcionar. É isso.
Krishnamurti: É isso. Agora se o cérebro estiver funcionando dentro do campo do tempo, para cima e para baixo, negativamente, positivamente, pode a inteligência operar nesse movimento de tempo? Ou deve esse instrumento estar quieto para que a inteligência possa operar?
Bohm: Sim. Eu colocaria isso de forma levemente diferente. A quietude do instrumento é a operação a inteligência.
Krishnamurti: Sim, isso está correto. Os dois não estão separados.
Bohm: Eles são um e o mesmo. A não-quietude do instrumento é a falha da inteligência.
Krishnamurti: Está correto.
Bohm: Mas acho que seria útil retornar a questões que tendem a ser levantadas no todo do pensamento científico e filosófico. Nós faríamos a pergunta: há algum sentido no qual a inteligência exista independentemente da matéria? Você vê que algumas pessoas têm achado que pensamento e matéria têm alguma espécie de existência separada. Essa é uma questão que vem à tona. Pode não ser relevante, mas acho que deveria ser considerada para auxiliar a tornar a mente quieta. Considerar questões que não podem ser claramente respondidas é uma das coisas que perturba a mente.
Krishnamurti: Mas veja, senhor, quando você diz “auxiliar a mente a se tornar quieta”, o pensamento vai ajudar no despertar da inteligência? É este o significado da frase, não? Pensamento e matéria e o exercício do pensamento e o movimento do pensamento, ou o pensamento dizendo a si mesmo “Ficarei quieto com o fim de auxiliar o despertar da inteligência”. Qualquer movimento do pensamento é tempo, qualquer movimento, porque o pensamento é mensurável, está funcionando positivamente ou negativamente, harmoniosamente ou desarmoniosamente, neste campo. E compreendendo isso, o pensamento pode dizer inconscientemente, de modo desapercebido, que “Ficarei quieto para conseguir isto ou aquilo”, então isto está ainda dentro do campo do tempo.
Bohm: Sim. Ele está ainda projetando.
Krishnamurti: O pensamento está projetando a coisa para capturá-la. Então como a inteligência tem lugar – não como – quando ela desperta?
Bohm: Uma vez mais a questão está no tempo.
Krishnamurti: É por isso que não quero usar as palavras “quando”, “como”.
Bohm: Você deveria talvez dizer que a condição para o despertar da inteligência é a inoperância do pensamento.
Krishnamurti: Sim.
Bohm: Mas, como o despertar da inteligência, essa inoperância não é apenas a condição. Não se pode nem mesmo perguntar se há condições para a inteligência despertar. Até mesmo falar sobre uma condição é uma forma de pensamento.
Krishnamurti: Sim. Concordemos que qualquer movimento do pensamento, em qualquer direção, vertical, horizontal, em ação ou inação, está ainda dentro do tempo – qualquer movimento do pensamento.
Bohm: Sim.
Krishnamurti: Então qual é a relação do movimento com essa inteligência que não é um movimento, que não é do tempo, que não é o produto do pensamento? Onde os dois podem se encontrar?
Bohm: Eles não se encontram. Mas ainda assim há uma relação.
Krishnamurti: Isso é o que estamos tentando descobrir. Há qualquer relação, em primeiro lugar? Pensa-se que haja uma relação, espera-se que haja uma relação, projeta-se uma relação. Há uma relação, de todo?
Bohm: Isso depende do que você quer dizer com relação.
Krishnamurti: Relação: estar em contato com, reconhecimento, um sentimento de estar tocando.
Bohm: Bem, a palavra relação deve significar algo mais.
Krishnamurti: Que outro significado tem?
Bohm: Por exemplo, há o paralelo, não há? A harmonia entre duas coisas. Isso é, duas coisas podem estar em relação sem contato, mas por estarem simplesmente em harmonia.
Krishnamurti: Harmonia significa um movimento das duas numa mesma direção?
Bohm: Deve significar também, em certo sentido, continuar na mesma ordem.
Krishnamurti: Na mesma ordem: mesma direção, mesma profundidade, mesma intensidade – tudo isso é harmonia. Mas pode o pensamento sequer ser harmônico? – pensamento como movimento, não pensamento estático.
Bohm: Entendo. Há aquele pensamento que se abstrai como estático, na geometria, digamos, que pode ter alguma harmonia; mas o pensamento, como realmente se move, é sempre contraditório.
Krishnamurti: Portanto ele não tem harmonia em si mesmo. Mas a inteligência tem harmonia em si mesma.
Bohm: Acho que vejo a fonte da confusão. Nós temos os produtos estáticos do pensamento que parecem ter uma certa harmonia relativa. Mas essa harmonia é realmente o resultado da inteligência, ao menos me parece. Na matemática, podemos obter uma certa harmonia relativa do produto do pensamento, ainda que o real movimento de pensamento do matemático não esteja necessariamente em harmonia, geralmente não estará em harmonia. Agora, essa harmonia que aparece na matemática é o resultado da inteligência, não?
Krishnamurti: Prossiga, senhor.
Bohm: Não é harmonia perfeita porque tem sido provado que toda forma de matemática tem algum limite; por isso chamo isso de uma harmonia apenas relativa.
Krishnamurti: Sim. Agora, no movimento do pensamento há harmonia? Se há, então ele tem relação com a inteligência. Se não há harmonia, mas contradições e todo o resto, então o pensamento não tem relação com a inteligência.
Bohm: Então você diria que poderíamos funcionar inteiramente sem pensamento?
Krishnamurti: Eu colocaria isso de outra forma. A inteligência usa o pensamento.
Bohm: Tudo bem. Mas como ela pode utilizar algo que está desarmonioso?
Krishnamurti: Expressão, comunicação, usando o pensamento que é contraditório, que não é harmonioso, para criar coisas no mundo.
Bohm: Mas ainda assim deve haver harmonia em algum outro aspecto, naquilo que é feito com o pensamento, no que acabamos de descrever.
Krishnamurti: Vamos vagarosamente. Podemos primeiro pôr em palavras, negativamente ou positivamente, o que é inteligência, o que não é inteligência? Ou isso é impossível porque as palavras são pensamento, tempo, medida e etc.?
Bohm: Não podemos pôr em palavras. Estamos tentando apontar. Podemos dizer que o pensamento pode funcionar como um ponteiro para a inteligência, e então sua contradição não importa.
Krishnamurti: Isso está correto. Isso está correto.
Bohm: Porque não estamos utilizando o pensamento por seu conteúdo, ou seu significado, mas, em vez disso, como um ponteiro que aponta para além do domínio do tempo.
Krishnamurti: Então o pensamento é um ponteiro. O conteúdo é a inteligência.
Bohm: O conteúdo para o qual o pensamento aponta.
Krishnamurti: Sim. Podemos dispor a coisa de modo inteiramente diferente? Podemos dizer, o pensamento é estéril?
Bohm: Sim. Quando se move por si mesmo, sim.
Krishnamurti: Que é mecânico e todo o resto. O pensamento é um ponteiro, mas sem inteligência o ponteiro não tem valor.
Bohm: Poderíamos dizer que a inteligência lê o ponteiro? Se não tiver ninguém para lê-lo, então o ponteiro não aponta.
Krishnamurti: De fato. Então a inteligência é necessária. Sem ela, o pensamento não tem significado, de todo.
Bohm: Mas agora poderíamos dizer que se o pensamento não é inteligente ele aponta de um modo muito confuso?
Krishnamurti: Sim, de um modo irrelevante.
Bohm: Irrelevante, sem significado e etc. Então com inteligência ele começa a apontar de uma outro modo. Mas então de alguma forma pensamento e inteligência parecem se fundir numa função comum.
Krishnamurti: Sim. Então podemos perguntar: o que é ação relacionada à inteligência? Certo?
Bohm: Sim.
Krishnamurti: O que é ação em relação com a inteligência, e, na execução dessa ação, o pensamento é necessário?
Bohm: Sim; bem, o pensamento é necessário e esse pensamento aponta obviamente em direção à matéria. Mas parece apontar nos dois sentidos – para trás, em direção à inteligência, também. Uma das questões que sempre vêm à tona é: deveríamos dizer que inteligência e matéria são meramente uma distinção dentro da mesma coisa, ou elas são diferentes? Estão realmente separadas?
Krishnamurti: Eu acho que estão separadas, são distintas.
Bohm: São distintas, mas estão realmente separadas?
Krishnamurti: O que você quer dizer por “separadas”? Não relacionadas, não conectadas, sem uma fonte comum?
Bohm: Sim. Elas têm uma fonte comum?
Krishnamurti: Esse é o ponto. Pensamento, matéria e inteligência, têm eles uma fonte comum? (longa pausa) Acho que têm.
Bohm: De outra maneira, não poderia haver harmonia, obviamente.
Krishnamurti: Mas veja, o pensamento tem dominado o mundo. Você entende? – dominado.
Bohm: Domina o mundo.
Krishnamurti: O pensamento, o intelecto, domina o mundo. E portanto a inteligência tem um lugar muito pequeno aqui. Quando uma coisa domina, a outra tem de ser subserviente.
Bohm: Pergunta-se, não sei se é relevante, como isso veio a acontecer.
Krishnamurti: Isso é extremamente simples.
Bohm: O que você diria?
Krishnamurti: O pensamento tem que ter segurança; está procurando por segurança em todo o seu movimento.
Bohm: Sim.
Krishnamurti: Mas a inteligência não está buscando segurança. Ela não tem segurança. A idéia de segurança não existe na inteligência. Ela por si mesma é segura, e não “busca segurança”.
Bohm: Sim, mas como aconteceu de a inteligência permitir que fosse dominada?
Krishnamurti: Ó, isso está muito claro. Prazer, conforto, segurança física, primeiro de tudo segurança física: segurança no relacionamento, segurança na ação, segurança…
Bohm: Mas isso é a ilusão da segurança.
Krishnamurti: Ilusão de segurança, com certeza.
Bohm: Você diria que o pensamento escapou do controle e deixou de permitir que a inteligência o mantivesse em um estado ordenado, ou pelo menos que deixou de estar em harmonia com ela, e começou a mover-se por conta própria.
Krishnamurti: Por conta própria.
Bohm: Buscando segurança e prazer e etc.
Krishnamurti: Como estávamos dizendo outro dia em nossa conversa, todo o mundo ocidental é baseado na medida; e o mundo oriental tentou ir além dela. Mas eles utilizaram o pensamento para isso.
Bohm: Tentaram, de qualquer forma.
Krishnamurti: Tentaram ir além da medida pelo exercício do pensamento; portanto, foram capturados no pensamento. Agora, segurança, segurança física, é necessária e portanto a existência física, os prazeres físicos, o bem-estar físico se tornou tremendamente importante.
Bohm: Sim, estava pensando um pouco sobre isso. Se você retroceder até o animal, então há a resposta instintiva em direção ao prazer e à segurança: isso estaria correto. Mas agora, quando o pensamento entra, pode ofuscar o instinto e produzir toda sorte de glamour, mais prazer, mais segurança. E os instintos não são inteligentes o suficiente para lidar com a complexidade do pensamento, portanto o pensamento cai no erro, porque excitou os instintos e eles demandam mais.
Krishnamurti: Então o pensamento realmente criou um mundo de ilusão, miasma, confusão, e pôs a inteligência de lado.
Bohm: Bem, como dissemos antes, isso tornou o cérebro muito caótico e barulhento e a inteligência é o silêncio do cérebro; portanto, o cérebro barulhento não é inteligente.
Krishnamurti: O cérebro barulhento não é inteligente, é claro!
Bohm: Bem, isso explica mais ou menos a origem da coisa.
Krishnamurti: Nós estamos tentando descobrir qual a relação, na ação, entre o pensamento e a inteligência. Tudo é ação ou inação. E qual a relação disso com a inteligência? O pensamento realmente produz ação caótica, ação fragmentária.
Bohm: Quando não é comandado pela inteligência.
Krishnamurti: E não é, no modo como nós todos vivemos.
Bohm: Isto se deve ao que acabamos de dizer.
Krishnamurti: Isto é atividade fragmentada; não é uma atividade de uma totalidade. A ação da totalidade é inteligência.
Bohm: A inteligência também tem de entender a atividade do pensamento.
Krishnamurti: Sim, nós dissemos isso.
Bohm: Agora você diria que, quando a inteligência compreende a atividade do pensamento, o pensamento é diferente em sua operação?
Krishnamurti: Sim, obviamente. Isso é, se o pensamento criou o nacionalismo como meio de segurança e então vê a falácia disso, o ver a falácia disso é inteligência. O pensamento então cria um tipo de mundo diferente, no qual o nacionalismo não existe.
Bohm: Sim.
Krishnamurti: E nem divisão, guerra, conflito e todo o resto.
Bohm: Isso está bem claro. A inteligência vê a falsidade do que está acontecendo. Quando o pensamento está livre desta falsidade, é diferente. Então ele começa a ser um paralelo para a inteligência.
Krishnamurti: Isso está correto.
Bohm: Isso é, ele começa a levar as implicações da inteligência.
Krishnamurti: Portanto o pensamento tem um lugar.
Bohm: Isso é muito interessante porque o pensamento nunca é de fato controlado ou dominado pela inteligência, mas sempre se move por conta própria. Mas à luz da inteligência, quando a falsidade é vista, então o pensamento se move paralelamente ou em harmonia com a inteligência.
Krishnamurti: Isso está correto.
Bohm: Mas nunca há nada que force o pensamento a fazer o que quer que seja. Isso sugeriria que a inteligência e o pensamento têm essa origem ou substância comum, e que são duas formas de chamar a atenção para um todo maior.
Krishnamurti: Sim. Pode-se ver como politicamente, religiosamente, psicologicamente, o pensamento tem criado um mundo de tremenda contradição, fragmentação, e a inteligência que é o produto dessa confusão então tenta trazer ordem à confusão. Não é aquela inteligência que vê a falsidade disso tudo. Não sei se estou me fazendo entender. Você vê, pode-se ser terrivelmente inteligente, ainda que se seja caótico.
Bohm: Bem, em alguns aspectos.
Krishnamurti: Isso é o que está acontecendo no mundo.
Bohm: Mas eu suponho que seja difícil de entender isso nesse momento. Poder-se-ia dizer que numa esfera limitada parece que a inteligência é capaz de operar, mas, fora dela, não.
Krishnamurti: Nós estamos, afinal, preocupados com o viver, não com teorias. Está-se preocupado com uma vida em que a inteligência opere. Inteligência que não pertence ao tempo, que não pertence à medida, que não é o produto ou o movimento do pensamento, ou da ordem do pensamento. Agora um ser humano quer viver um tipo diferente de vida. Ele está dominado pelo pensamento, seu pensamento está sempre funcionando na medição, na comparação, no conflito. Ele pergunta “Como posso tornar-me livre de tudo isso com o fim de ser inteligente?”, “Como pode o ‘eu’, como posso ‘eu’ ser o instrumento dessa inteligência?”.
Bohm: Obviamente, isso não pode ser.
Krishnamurti: Exatamente!
Bohm: Porque esse pensamento no tempo é a essência da não-inteligência.
Krishnamurti: Mas está-se pensando nesses termos todo o tempo.
Bohm: Sim. Isso é o pensamento projetando algum tipo de fantasia do que seja inteligência, e tentando alcançar essa fantasia.
Krishnamurti: Portanto eu diria que o pensamento deve estar completamente quieto para o despertar da inteligência. Não pode haver um movimento de pensamento e ocorrer o despertar da inteligência.
Bohm: Isso está claro em um nível. Consideramos o pensamento como sendo realmente mecânico e isso pode ser percebido num nível – mas o mecanismo ainda continua.
Krishnamurti: Continua, sim…
Bohm: … através dos instintos, prazer, medo e etc. A inteligência tem de vir para segurar essa questão dos prazeres, medos, desejos, que fazem o pensamento continuar.
Krishnamurti: Sim.
Bohm: E você vê, há sempre uma armadilha: isso é apenas nosso conceito ou imagem da questão, que é parcial.
Krishnamurti: Então, como ser humano, eu ficaria preocupado apenas com essa questão central. Eu sei o quão confusa, contraditória, desarmoniosa a vida está. É possível modificar isso de modo que a inteligência possa funcionar em minha vida, de modo que eu possa viver sem desarmonia, de modo que o ponteiro, a direção seja guiada pela inteligência? Esse talvez seja o porquê de as pessoas religiosas, em vez de utilizarem a palavra inteligência, terem utilizado a palavra Deus.
Bohm: Qual a vantagem?
Krishnamurti: Não sei qual é a vantagem.
Bohm: Mas por que utilizar tal palavra?
Krishnamurti: Ela veio do medo primitivo, medo da natureza, e, gradualmente, a partir disso, cresceu a idéia de que há um pai superior.
Bohm: Mas isso ainda é o pensamento funcionando por si mesmo, sem inteligência.
Krishnamurti: É claro. Estou apenas relembrando. Dizem confie em Deus, tenha fé em Deus, e então Deus operará através de você.
Bohm: Deus é talvez uma metáfora para inteligência – mas as pessoas geralmente não tomam isso como uma metáfora.
Krishnamurti: Claro que não, é uma imagem terrificante.
Bohm: Sim. Poder-se-ia dizer que, se Deus significa aquilo que é imensurável, que está além do pensamento…
Krishnamurti: …e inominável, imensurável, portanto não tem uma imagem.
Bohm: Então vai operar dentro do mensurável.
Krishnamurti: Sim. O que estou tentando transmitir é que o desejo por essa inteligência, através do tempo, tem criado a imagem de Deus. E através da imagem de Deus, Jesus, Krishna, ou quem quer que seja, tendo fé nisso – o que ainda é o movimento do pensamento – espera-se que haja harmonia na própria vida.
Bohm: E essa espécie de imagem, porque é tão total, produz um desejo, uma urgência sobrepujante; isto é, que sobrepuja a racionalidade … tudo.
Krishnamurti: Você ouviu, outro dia, o que os arcebispos e bispos estavam dizendo, que apenas Jesus importa, nada mais.
Bohm: Mas esse é o mesmo movimento pelo qual o prazer sobrepuja a racionalidade.
Krishnamurti: O medo e o prazer.
Bohm: Eles sobrepujam; nenhuma proporção pode ser estabelecida.
Krishnamurti: Sim, o que estou tentando dizer é: você vê, o mundo inteiro está condicionado dessa forma.
Bohm: Sim, mas a questão é aquilo a que você aludiu: o que é esse mundo que está condicionado dessa forma? Se tomarmos esse mundo como existente independentemente do pensamento, então caímos na mesma armadilha de novo.
Krishnamurti: É claro, é claro.
Bohm: Isso é, o mundo condicional inteiro é o resultado desse modo de pensar, é tanto a causa quanto o efeito desse modo de pensar.
Krishnamurti: Correto.
Bohm: E essa forma de pensar é desarmonia e caos e não-inteligência e etc.
Krishnamurti: Eu estava ouvindo a Conferência do Partido Trabalhista em Blackpool – quão espertos, alguns deles muito sérios, bilíngües e tudo o mais, pensando em termos de Partido Trabalhista e Partido Conservador. Eles não dizem “Juntemo-nos e vejamos o que é o melhor para os seres humanos.”
Bohm: Eles não são capazes.
Krishnamurti: Isso mesmo, mas eles estão exercitando sua inteligência!
Bohm: Bem, naquele padrão limitado. Isso é o que tem sido sempre nosso problema; as pessoas têm desenvolvido tecnologia e outras coisas em termos de alguma inteligência limitada, que está servindo a propósitos altamente não-inteligentes.
Krishnamurti: Sim, é isso.
Bohm: Por milhares de anos isso tem prosseguido. Então, é claro, as reações surgem: os problemas são muito grandes, muito vastos.
Krishnamurti: Mas isso é realmente muito simples, extraordinariamente simples, esse sentido de harmonia. Porque é simples, pode funcionar no mais complexo campo.
Krishnamurti: Regressemos. Dissemos que a fonte do pensamento e da inteligência é comum…
Bohm: Sim, chegamos até aí.
Krishnamurti: O que é essa fonte? Ela é geralmente atribuída a algum conceito filosófico, ou dizem que essa fonte é Deus – eu estou apenas usando essa palavra por ora – ou Brahman. Essa fonte é comum, é o movimento central que divide a si mesmo em matéria e inteligência. Mas isto é apenas uma asserção verbal, é apenas uma idéia, que ainda é pensamento. Não se pode encontrar isso pelo pensamento.
Bohm: Isso levanta a questão: se você encontra isso, então o que é “você”?
Krishnamurti: “Você” não existe. “Você” não pode existir quando você está perguntando qual é a fonte. “Você” é tempo, movimento, condicionamento ambiental – você é tudo isso.
Bohm: Nessa questão, o todo dessa divisão é posto de lado.
Krishnamurti: Absolutamente. Esse é o ponto, não?
Bohm: Não há tempo…
Krishnamurti: E ainda assim continuamos dizendo “Eu não exercitarei o pensamento”. Quando o “eu” entra, isso significa divisão: então, entendendo o todo disso – sobre o que estivemos conversando – eu elimino o “eu”, inteiramente.
Bohm: Mas isso soa como uma contradição.
Krishnamurti: Eu sei. Eu não posso eliminá-lo. Isso acontece. Então o que é a fonte? Ela pode sequer ser nomeada? Por exemplo, o sentimento religioso dos judeus é que isso é inominável: você não nomeia, não pode falar a respeito, não pode tocar. Pode-se apenas olhar. E os hindus e outros dizem a mesma coisa de um modo diferente. Os cristãos iludiram a si mesmos pela palavra Jesus, essa imagem, eles nunca foram à fonte disso.
Bohm: Essa é uma questão complexa; pode ser que eles estivessem tentando sintetizar muitas filosofias, hebraica, grega e oriental.
Krishnamurti: Agora eu quero chegar a isto: o que é a fonte? Pode o pensamento encontrá-la? E ainda assim o pensamento nasceu dessa fonte; e a inteligência também. São como dois fluxos se movendo em direções diferentes.
Bohm: Você diria que a matéria também nasce dessa fonte, de modo mais geral?
Krishnamurti: Claro.
Bohm: Eu quero dizer todo o universo. Mas então a fonte está além do universo.
Krishnamurti: É claro. Podemos colocar desse modo? O pensamento é energia, assim como a inteligência.
Bohm: Assim como a matéria.
Krishnamurti: Pensamento, matéria, o mecânico, é energia. Inteligência também é energia. O pensamento está confuso, poluído, dividindo a si mesmo, fragmentando a si mesmo.
Bohm: Sim, ele é múltiplo.
Krishnamurti: E a inteligência não. Não está poluída. Não pode dividir a si mesma como “minha inteligência” e “sua inteligência”. Ela é inteligência, não é divisível. Agora ela brotou de uma fonte de energia que dividiu a si mesma.
Bohm: Por que ela se dividiu?
Krishnamurti: Por razões físicas, por conforto…
Bohm: Para manter a existência física. Então uma parte da inteligência foi modificada de um modo que pudesse auxiliar a manter a existência física.
Krishnamurti: Sim.
Bohm: Isso se desenvolveu de uma certa maneira.
Krishnamurti: E prosseguiu dessa maneira. Os dois são energia. Há apenas uma energia.
Bohm: Sim, eles são diferentes formas de energia. Há muitas analogias para isso, embora numa escala muito mais limitada. Na física, poder-se-ia dizer que a luz é ordinariamente um movimento de onda muito complexo, mas, no laser, pode-se fazer com que se mova toda junta, num modo muito simples e harmônico.
Krishnamurti: Sim. Eu estive lendo sobre o laser. Que coisas monstruosas irão fazer com ele.
Bohm: Sim, utilizando-o destrutivamente. O pensamento pode obter coisas boas mas então elas sempre são utilizadas de um modo mais bruto que é destrutivo.
Krishnamurti: Então há apenas energia, que é a fonte.
Bohm: Você diria que a energia é um tipo de movimento?
Krishnamurti: Não, ela é energia. No momento em que se torna movimento, cai nesse campo do pensamento.
Bohm: Nós temos de tornar mais clara essa noção de energia. Eu pesquisei essa palavra também. Você vê, ela está baseada na noção de trabalho; energia significa “trabalhar internamente”.
Krishnamurti: Trabalhar internamente, sim.
Bohm: Mas agora você diz que há uma energia que funciona, mas sem movimento.
Krishnamurti: Sim. Eu estava pensando sobre isso ontem – não pensando – eu compreendi que a fonte está lá, incontaminada, não-movimento, intocada pelo pensamento, está lá. A partir dela, esses dois nasceram. Por que nasceram, de todo?
Bohm: Um era necessário à sobrevivência.
Krishnamurti: Isso é tudo. Na sobrevivência, a fonte – em sua totalidade, em sua completude – foi negada, ou posta de lado. Aquilo a que estou tentando chegar é isso, senhor. Eu quero descobrir, como um ser humano vivendo nesse mundo com todo caos e sofrimento, pode a mente humana tocar essa fonte na qual as duas divisões não existem? – e, por haver tocado essa fonte, que não tem divisões, pode essa mente operar sem o senso de divisão? Não sei se estou conseguindo transmitir isso.
Bohm: Mas como é possível à mente humana não tocar a fonte? Por que ela não toca a fonte?
Krishnamurti: Porque somos consumidos pelo pensamento, pela esperteza do pensamento, pelo movimento do pensamento. Todos os seus deuses, suas meditações – tudo é pensamento.
Bohm: Sim. Acho que isso nos traz à questão de vida e morte. Isso se relaciona à sobrevivência; porque essa é uma das coisas que entram no caminho.
Krishnamurti: O pensamento e seu campo de segurança, seu desejo por segurança, criou a morte como algo separado dele mesmo.
Bohm: Sim, esse pode ser o ponto-chave.
Krishnamurti: E é.
Bohm: Pode-se olhar para isso dessa forma. O pensamento construiu a si mesmo como um instrumento para a sobrevivência. Agora no entanto…
Krishnamurti: …ele criou a imortalidade em Jesus, ou nisso ou naquilo.
Bohm: O pensamento não pode possivelmente contemplar sua própria morte. Então, se tenta fazê-lo, sempre projeta algo mais, algum outro ponto de vista mais amplo a partir do qual parece estar observando a morte. Se qualquer um tenta imaginar que está morto, então está ainda imaginando que está vivo e olhando a si mesmo como morto. Pode-se sempre complicar isso em toda espécie de noção religiosa; mas parece ser inerente ao pensamento a impossibilidade de considerar a morte apropriadamente.
Krishnamurti: Ele não pode. Isto significa terminar a si mesmo.
Bohm: Isso é muito interessante. Suponha que consideramos a morte do corpo, que vemos de fora; o organismo morre, perde sua energia e portanto desfalece.
Krishnamurti: É que o corpo é o instrumento da energia.
Bohm: Então digamos que a energia cesse de imbuir o corpo e portanto o corpo não possua mais qualquer inteireza. Poder-se-ia dizer o mesmo com o pensamento; a energia de determinadas maneiras segue para o pensamento, assim como para o corpo – é assim?
Krishnamurti: Correto.
Bohm: Você e outras pessoas têm freqüentemente usado a frase: “A mente morre para todo pensamento.”. Essa forma de colocação induz à confusão num primeiro momento, porque se acharia que o pensamento é que deveria morrer.
Krishnamurti: De fato.
Bohm: Mas agora você está dizendo que é a mente que morre, ou a energia que morre para o pensamento. O mais próximo que posso chegar do significado disso é que quando o pensamento está trabalhando, está investido com uma certa energia pela mente ou pela inteligência; e quando o pensamento não é mais relevante, então a energia se vai e o pensamento é como um organismo morto.
Krishnamurti: Está correto.
Bohm: Agora é muito difícil para a mente aceitar isso. A comparação entre pensamento e organismo parece tão pobre, porque o pensamento não é substancial e o organismo é. Então a morte do organismo aparenta ser algo muito mais significante do que a morte do pensamento. Agora esse é um ponto que não está claro. Você diria que na morte do pensamento nós temos a essência da morte do organismo?
Krishnamurti: Obviamente.
Bohm: Embora essa morte esteja numa escala menor, como de fato está, é da mesma natureza?
Krishnamurti: Como dissemos, há energia nos dois, e o pensamento em seu movimento é dessa energia, e o pensamento não pode ver a si mesmo morrer.
Bohm: Ele não tem meio de imaginar, projetar, ou conceber sua própria morte.
Krishnamurti: Portanto, ele foge da morte.
Bohm: Bem, ele provê a si mesmo a ilusão.
Krishnamurti: Ilusão, é claro. E ele criou a ilusão da imortalidade ou um estado além da morte, uma projeção de seu próprio desejo por continuidade.
Bohm: Bem, essa é uma coisa, que o pensamento pode ter começado por desejar a continuidade do organismo.
Krishnamurti: Sim, está correto, e então foi além disso.
Bohm: Foi além disso, para desejar sua própria continuidade. Esse foi o engano, foi aí que ele errou. Encarou a si mesmo como uma extensão, não meramente uma extensão, mas a essência do organismo. Primeiro o pensamento está funcionando meramente no organismo e então começa e ver a si mesmo como a essência do organismo.
Krishnamurti: Correto.
Bohm: Então o pensamento começa a desejar sua própria imortalidade.
Krishnamurti: E o pensamento sabe, está muito bem consciente de que não é imortal.
Bohm: Ele sabe disso apenas de fora, no entanto. Quero dizer, ele sabe disso como um fato externo.
Krishnamurti: Portanto cria a imortalidade em figuras, imagens.
Krishnamurti: Eu ouço tudo isso como alguém que está de fora e digo a mim mesmo “Isto é perfeitamente verdadeiro, tão claro, lógico, são; nós vemos isso bem claramente, tanto psicológica quanto fisicamente.” Agora minha questão, observando tudo isso, é: pode a mente manter a pureza da fonte original? A imaculada clareza original daquela energia que não é tocada pela corrupção do pensamento? Não sei se estou expondo claramente.
Bohm: A questão está clara.
Krishnamurti: Pode a mente fazer isso? Pode a mente sequer descobrir isso?
Bohm: O que é a mente?
Krishnamurti: A mente, como nós dizemos agora, ou organismo, o pensamento, o cérebro com todas as suas memórias, experiências e tudo isso, que é tudo do tempo. E a mente diz “Posso chegar a isso?”. Ela não pode. Então eu digo a mim mesmo “Como ela não pode, ficarei quieto.”. Você vê os truques que ela tem pregado.
Bohm: Sim.
Krishnamurti: Eu aprenderei como estar quieto; aprenderei como meditar com o objetivo de ficar quieto. Eu vejo a importância de se ter uma mente que seja livre do tempo, livre do mecanismo do pensamento, eu a controlarei, a subjugarei, expulsarei o pensamento. Mas isto ainda é operação do pensamento. Isso está muito claro. Então o que ela deve fazer? Porque um ser humano vive nessa desarmonia, ele deve questionar isso. E isso é o que estamos fazendo. Como começamos a questionar isso, ou no questionar, chegamos a essa fonte. É ela uma percepção, um insight, e esse insight não tem nada, coisa alguma a ver com o pensamento? É o insight o resultado do pensamento? A conclusão de um insight é pensamento, mas o insight propriamente não é pensamento. Assim, eu obtive uma chave para isso. Então o que é insight? Posso convidá-lo, cultivá-lo?
Bohm: Você não pode fazer nenhuma dessas coisas. Mas há um tipo de energia que é necessário.
Krishnamurti: Exatamente. Eu não posso fazer nenhuma daquelas coisas. Quando eu cultivo o insight, isso é desejo. Quando digo que vou fazer isto ou aquilo, é o mesmo. Então o insight não é o produto do pensamento. Não está na ordem do pensamento. Agora, como se chega até esse insight? (Pausa) Nós já chegamos a ele por havermos negado tudo aquilo.
Bohm: Sim, ele está lá. Você não pode nunca responder àquela questão de como você chega até qualquer coisa.
Krishnamurti: Não. Eu acho que isto está muito claro, senhor. Você chega até o insight quando você vê toda a coisa. Então o insight é a percepção do todo. Um fragmento não pode ver isso, mas o “eu” vê os fragmentos, e o “eu” vendo os fragmentos vê o todo, e a qualidade de uma mente que vê o todo não é tocada pelo pensamento; portanto há percepção, há insight.
Bohm: Talvez devamos ir mais devagar a esse respeito. Nós vemos todos os fragmentos: poderíamos dizer que a energia, a atividade real que vê esses fragmentos é inteira?
Krishnamurti: Sim, sim.
Bohm: Nós nem sequer fazemos esforço para ver o todo porque…
Krishnamurti: …nós somos educados – e todo o resto.
Bohm: Mas eu quero dizer, nós de qualquer forma não veríamos o todo como alguma coisa. Em vez disso, a totalidade é a liberdade de ver todos os fragmentos.
Krishnamurti: Isso está correto. Liberdade para ver. A liberdade não existe quando há fragmentos.
Bohm: Isso cria um paradoxo.
Krishnamurti: É claro.
Bohm: Mas o todo não começa a partir dos fragmentos. Uma vez que o todo opera, não há fragmentos. Então o paradoxo surge da suposição de que os fragmentos são reais, de que eles existem independentemente do pensamento. Então você diria, eu suponho, que os fragmentos existem comigo em meus pensamentos, e então eu devo de alguma forma fazer alguma coisa com relação a eles – o que seria um paradoxo. O todo começa pelo insight de que esses fragmentos são, de certa maneira, nada. É assim que isso parece ser, para mim. Eles não são substanciais. São muito insubstanciais.
Krishnamurti: Insubstanciais, sim.
Bohm: E portanto eles não impedem a totalidade.
Krishnamurti: Com efeito.
Bohm: Você vê, uma das coisas que freqüentemente causa confusão é isso, quando você põe os fragmentos em termos de pensamento, parece que você está diante dos fragmentos, que são reais, realidade substancial. Então você tem de vê-los, e no entanto, você diz, enquanto os fragmentos existam, não há totalidade, de modo que você não pode vê-los. Mas tudo isso retorna para a coisa, a fonte.
Krishnamurti: Eu estou certo, senhor, pessoas realmente sérias têm feito essa pergunta. Eles a têm feito e têm tentado encontrar uma resposta através do pensamento.
Bohm: Sim, bem, isso parece natural.
Krishnamurti: E eles nunca perceberam que foram pegos no pensamento.
Bohm: Esse é sempre o problema. Todo mundo se depara com esse problema: parece que se está olhando para qualquer coisa, para seus próprios problemas, dizendo “Esses são meus problemas, eu estou olhando.”. Mas esse olhar é apenas pensar, mas é confundido com olhar. Essa é uma das confusões que surgem. Se você diz “não pense, apenas olhe” a pessoa sente que já está olhando.
Krishnamurti: De fato. Então você vê, essa questão surgiu e eles dizem “Tudo bem, então eu devo controlar o pensamento, subjugar o pensamento e devo tornar minha mente quieta de modo que ela se torne inteira, então eu poderei ver as partes, todos os fragmentos, então eu tocarei a fonte.”. Mas isso ainda é a operação do pensamento.
Bohm: Sim, isso significa que a operação do pensamento é inconsciente para a maioria e portanto a pessoa não sabe quando ela está acontecendo. Nós podemos dizer que conscientemente compreendemos que tudo isso tem de ser modificado, tem de ser diferente.
Krishnamurti: Mas isso ainda está ocorrendo inconscientemente. Então você pode falar ao meu inconsciente, sabendo que meu cérebro consciente vai resistir a você? Porque você está me contando algo que é revolucionário, você está me dizendo algo que abala toda a minha casa que eu construí com tanto esmero, e eu não lhe darei ouvidos – você entendeu? Em minhas reações instintivas eu o afasto. Então você compreende isso e diz “Veja, tudo bem, velho amigo, apenas não se preocupe em me dar ouvidos. Eu vou falar ao seu inconsciente. Eu vou falar ao seu inconsciente e fazer com que ele veja que qualquer movimento que faça está ainda dentro do campo do tempo e etc.”. Assim, sua mente consciente nunca está em operação. Quando ela opera, deve inevitavelmente resistir também, ou dizer “Eu vou aceitar”; portanto ela cria um conflito nela mesma. Então, você pode falar ao meu inconsciente?
Bohm: Pode-se sempre perguntar como.
Krishnamurti: Não, não. Você pode dizer a um amigo “Não resista, não pense sobre isso, mas eu vou falar com você.”. “Nós dois estamos nos comunicando um com outro sem que a mente consciente ouça.”
Bohm: Sim.
Krishnamurti: Eu acho que isso é o que realmente ocorre. Quando você estava falando comigo – eu estive percebendo – eu não estava escutando muito suas palavras. Eu estava escutando você. Eu estava aberto a você, não a suas palavras, o que você explicou e etc. Eu disse a mim mesmo, tudo bem, abandone tudo isso, eu estou ouvindo você, não as palavras que você usa, mas o significado, a qualidade interior do seu sentimento que você queria me comunicar.
Bohm: Eu entendo.
Krishnamurti: Isso me modifica, não toda essa verbalização. Então você pode falar comigo sobre minhas idiotices, minha ilusões, minhas tendências peculiares, sem a mente consciente interferindo e dizendo “Por favor, não toque em tudo isso, deixe-me sozinho!”. Tentaram propaganda subliminar em anúncios, de modo que você não estaria prestando verdadeira atenção, seu inconsciente estaria, então você compraria aquela sopa em particular! Não estamos fazendo isso, o que seria mortal. O que estou dizendo é: não me escute com seus ouvidos conscientes, mas escute-me com os ouvidos que ouvem muito mais fundo. Essa é a forma com que eu ouvi você esta manhã, porque eu estou terrivelmente interessado na fonte, como você está. Você entendeu, senhor? Eu estou realmente interessado naquela coisa única. Tudo isso é o explicável, facilmente entendido – mas chegar junto àquela coisa, senti-la próxima! Você entendeu? Eu acho que esse é o modo de quebrar um condicionamento, um hábito, uma imagem que tem sido cultivada. Você fala sobre isso num nível em que a mente consciente não está totalmente interessada. Isso soa tolo, mas você entende o que quero dizer? Digamos, por exemplo que eu tenho um condicionamento; você pode apontá-lo dúzias de vezes, argumentar, mostrar a falácia dele, a estupidez – mas eu ainda continuo. Eu resisto, eu digo o que deveria ser, o que eu, na realidade, deveria fazer nesse mundo, e todo o resto. Mas você vê a verdade, que enquanto a mente está condicionada haverá conflito. Então você penetra ou empurra minha resistência para o lado e chega ao inconsciente, faz com que ele ouça você, porque o inconsciente é muito mais sutil, muito mais rápido. Ele pode estar assustado, mas vê o perigo do medo muito mais rápido do que a mente consciente o faz. Como quando eu estava caminhando na Califórnia no alto das montanhas: eu estava olhando para os pássaros e árvores e observando, e ouvi uma serpente e saltei. Foi o inconsciente que fez o corpo pular; eu vi a serpente quando saltei, estava a dois ou três pés de mim, poderia ter me picado muito facilmente. Se o cérebro consciente estivesse operando, levaria vários segundos.
Bohm: Para alcançar o inconsciente você tem de ter uma ação que não apele diretamente ao consciente.
Krishnamurti: Sim. Isso é afeição, isso é amor. Quando você fala à minha consciência desperta, ela é dura, esperta, sutil, aguda. E você a penetra, penetra-a com seu ver, com sua afeição, com todo o sentimento que tem. Isso opera, nada mais.
Brockwood Park
7 de Outubro de 1972
1. David Bohm, Professor de Física Teórica no Birbeck College, Universidade de Londres; autor de Causalidade & Chance na Física moderna, Teoria Quântica, e A Teoria da Relatividade Especial.
Fundada por Jiddu Krishnamurti em 1935 como uma extensão das Fundações Krishnamurti, a Instituição Cultural Krishnamurti tem por missão a preservação e divulgação dos ensinamentos no Brasil, sempre de acordo com as decisões da K.F.T (Krishnamurti Foundation Trust) e da K.F.A. (Krishnamurti Foundation of America), responsáveis diretas e exclusivas por tudo que se refere aos direitos de publicação, royalties e fiscalização do material publicado através de qualquer meio no Brasil e no mundo.
Ainda que nossos constantes esforços pela disponibilização da obra de Krishnamurti no mercado editorial brasileiro atinjam muito pouco daquilo que poderíamos pretender, buscamos sempre outras formas de levar ao público as notícias mais recentes a respeito dos projetos em andamento ao redor do mundo e o mesmo acesso privilegiado aos ensinamentos de que dispõem sobretudo os leitores de língua inglesa, tanto com relação aos livros quanto ao material digitalizado, tentando garantir os direitos necessários junto às fundações.
Essa é a razão de nosso empenho na distribuição das séries de DVDs produzidas na Inglaterra, nas traduções e parcerias com edições de revistas e jornais internacionais ligados às escolas e a todos os outros projetos ao redor do mundo. Sobretudo nos últimos meses, temos estreitado os laços com as fundações, recebendo inclusive, no dia 5 de junho, a visita de Michael Krohnen, cozinheiro e amigo pessoal de Krishnamurti durante os últimos anos de sua vida, autor do livro Kitchen Chronicles – 1001 lunches with J. Krishnamurti (ainda sem tradução em português).
Com o surgimento de vários novos projetos e atividades em nossa instituição, convidamos nosso público a ampliar cada vez mais o contato conosco, tendo sempre como ponto de referência nosso website e as edições da ICK em Revista, as únicas formas oficiais e legítimas de contato entre as fundações e os leitores brasileiros.
O Amor
A necessidade de segurança nas relações gera inevitavelmente o sofrimento e o medo. Essa busca de segurança, atrai a insegurança. Já encontrastes alguma vez segurança em alguma de vossas relações? Já? A maioria de nós quer a segurança de amar e ser amado, mas existirá amor quando cada um está a buscar a própria segurança, seu caminho próprio? Nós não somos amados porque não sabemos amar.
Que é o amor? Esta palavra está tão carregada e corrompida, que quase não tenho vontade de empregá-la. Todo o mundo fala de amor – toda a revista e jornal e todo missionário discorre interminavelmente sobre o amor. Amo a minha pátria, amo o prazer, amo a minha esposa, amo a Deus. O amor é uma ideia? Se é, pode então ser cultivado, nutrido, conservado com carinho, moldado, torcido de todas as maneiras possíveis. Quando dizeis que amais a Deus, que significa isso ? Significa que amais uma projeção de vossa própria imaginação, uma projeção de vós mesmo, revestida de certas formas de respeitabilidade, conforme o que pensais ser nobre e sagrado; o dizer “Amo a Deus” é puro contrassenso. Quando adorais a Deus, estais adorando a vós mesmo; e isso não é amor.
Incapazes, que somos, de compreender essa coisa humana chamada amor, fugimos para as abstrações. O amor pode ser a solução final de todas as dificuldades, problemas e aflições humanas. Assim, como iremos descobrir o que é o amor? Pela simples definição? A igreja o tem definido de uma maneira, a sociedade de outra, e há também desvios e perversões de toda a espécie. A adoração de uma certa pessoa, o amor carnal, a troca de emoções, o companheirismo – será isso o que se entende por amor? Essa foi sempre a norma, o padrão, que se tornou tão pessoal, sensual, limitado, que as religiões declararam que o amor é muito mais do que isso. Naquilo que denominam “amor humano”, veem elas que existe prazer, competição, ciúme, desejo de possuir, de conservar, de controlar, de influir no pensar de outrem e, sabendo da complexidade dessas coisas, dizem as religiões que deve haver outra espécie de amor – divino, belo, imaculado, incorruptível.
Em todo o mundo, certos homens chamados “santos” sempre sustentaram que olhar para uma mulher é pecaminoso; dizem que não podemos nos aproximar-nos de Deus se nos entregamos ao sexo e, por conseguinte, o negam, embora eles próprios se vejam devorados por ele. Mas, negando o sexo, esses homens arrancam os próprios olhos, decepam a própria língua, uma vez que estão negando toda a beleza da Terra. Deixaram famintos os seus corações e a sua mente; são entes humanos “desidratados”; baniram a beleza, porque a beleza está ligada à mulher.
Pode o amor ser dividido em sagrado e profano, humano e divino, ou só há amor? O amor é para um só e não para muitos? Se digo “Amo-te”, isso exclui o amor do outro? O amor é pessoal ou impessoal? Moral ou imoral? Familial ou não familial? Se amais a humanidade, podeis amar o indivíduo? O amor é sentimento? Emoção ? O Amor é prazer e desejo ? Todas essas perguntas indicam – não é verdade? – que temos ideias a respeito do amor, ideias sobre o que ele deve ou não deve ser, um padrão, um código criado pela cultura em que vivemos.
Assim, para examinarmos a questão do amor – o que é o amor – devemos primeiramente libertar-nos das incrustações dos séculos, lançar fora todos os ideais e ideologias sobre o que ele deve ou não deve ser. Dividir qualquer coisa em o que deveria ser e o que é, é a maneira mais ilusória de enfrentar a vida.
Ora, como iremos saber o que é essa chama que denominamos amor – não a maneira de expressá-lo a outrem, porém o que ele próprio significa? Em primeiro lugar rejeitarei tudo o que a igreja, a sociedade, meus pais e amigos, todas as pessoas e todos os livros disseram a seu respeito, porque desejo descobrir por mim mesmo o que ele é. Eis um problema imenso, que interessa a toda humanidade; há milhares de maneiras de defini-lo e eu próprio me vejo todo enredado neste ou naquele padrão, conforme a coisa que, no momento, me dá gosto ou prazer. Por conseguinte, para compreender o amor, não devo em primeiro lugar libertar-me de minhas inclinações e preconceitos? Vejo-me confuso, dilacerado pelos meus próprios desejos e, assim, digo entre mim: “Primeiro, dissipa a tua confusão. Talvez tenhas possibilidade de descobrir o que é amor através do que ele não é”.
O governo ordena: “Vai e mata, por amor à pátria!” Isso é amor? A religião preceitua: “Abandona o sexo, pelo amor de Deus”. Isso é amor? O amor é desejo? Não digas que não. Para a maioria de nós, é; desejo acompanhado de prazer, prazer derivado dos sentidos, pelo apego e o preenchimento sexual. Não sou contrário ao sexo, mas vede o que ele implica. O que o sexo vos dá momentaneamente é o total abandono de vós mesmos, mas, depois, voltais à vossa agitação; por conseguinte, desejais a constante repetição desse estado livre de preocupação, de problema, do “eu”. Dizeis que amais vossa esposa. Nesse amor está implicado o prazer sexual, o prazer de terdes uma pessoa em casa para cuidar dos filhos e cozinhar. Dependeis dela; ela vos deu o seu corpo, suas emoções, seus incentivos, um certo sentimento de segurança e bem-estar. Um dia, ela vos abandona; aborrece-se ou foge com outro homem, e eis destruído todo o vosso equilíbrio emocional; essa perturbação, de que não gostais, chama-se ciúme. Nele existe sofrimento, ansiedade, ódio e violência. Por conseguinte, o que realmente estais dizendo é: “Enquanto me pertences, eu te amo; mas, tão logo deixes de pertencer-me, começo a odiar-te. Enquanto posso contar contigo para a satisfação de minhas necessidades sociais e outras, amo-te, mas, tão logo deixes de atender a minhas necessidades, não gosto mais de ti”. Há, pois, antagonismo entre ambos, há separação, e quando vos sentis separados um do outro, não há amor. Mas, se puderdes viver com vossa esposa sem que o pensamento crie todos esses estados contraditórios, essas intermináveis contendas dentro de vós mesmo, talvez então – talvez – sabereis o que é o amor. Sereis então completamente livre, e ela também; ao passo que, se dela dependeis para os vossos prazeres, sois seu escravo. Portanto, quando uma pessoa ama, deve haver liberdade – a pessoa deve estar livre, não só da outra, mas também de si própria.
No estado de pertencer a outro, de ser psicologicamente nutrido por outro, de outro depender – em tudo isso existe sempre, necessariamente, a ansiedade, o medo, o ciúme, a culpa, e enquanto existe medo, não existe amor. A mente que se acha nas garras do sofrimento jamais conhecerá o amor; o sentimentalismo e a emotividade nada, absolutamente nada, têm que ver com o amor. Por conseguinte, o amor nada tem em comum com o prazer e o desejo.
O amor não é produto de pensamento, que é o passado. O pensamento não pode de modo nenhum cultivar o amor. O amor não se deixa cercar e enredar pelo ciúme; porque o ciúme vem do passado. O amor é sempre o presente ativo. Não é “amarei” ou “amei”. Se conheceis o amor, não seguireis ninguém. O amor não obedece. Quando se ama, não há respeito nem desrespeito.
Não sabeis o que significa amar realmente alguém – amar sem ódio, sem ciúme, sem raiva, sem procurar interferir no que o outro faz ou pensa, sem condenar, sem comparar – não sabeis o que isto significa? Quando há amor, há comparação? Quando amais alguém de todo o coração, com toda a vossa mente, todo o vosso corpo, todo o vosso ser, existe comparação? Quando vos abandonais completamente a esse amor, não existe “o outro”.
O amor tem responsabilidades e deveres, e emprega tais palavras? Quando fazeis alguma coisa por dever, há nisso amor? No dever não há amor. A estrutura do dever, na qual o ente humano se vê aprisionado, o está destruindo. Enquanto sois obrigado a fazer uma coisa, porque é vosso dever fazê-la, não amais a coisa que estais fazendo. Quando há amor, não há dever nem responsabilidade.
A maioria dos pais, infelizmente, pensa que são responsáveis por seus filhos, e seu senso de responsabilidade toma a forma de preceituar-lhes o que devem fazer e o que não devem fazer, o que devem ser e o que não devem ser. Querem que os filhos conquistem uma posição segura na sociedade. Aquilo a que chamam de responsabilidade faz parte daquela respeitabilidade que eles cultivam; e a mim me parece que, onde há respeitabilidade, não existe ordem; só lhes interessa o tornar-se um perfeito burguês. Preparando os filhos para se adaptarem à sociedade, estão perpetuando a guerra, o conflito e a brutalidade. Pode-se chamar a isso zelo e amor?
Zelar, com efeito, é cuidar como se cuida de uma árvore ou de uma planta, regando-a, estudando as suas necessidades, escolhendo o solo mais adequado, tratá-la com carinho e ternura; mas, quando preparais os vossos filhos para se adaptarem à sociedade, os estais preparando para serem mortos. Se amásseis vossos filhos, não haveria guerras.
Quando perdeis alguém que amais, verteis lágrimas; essas lágrimas são por vós mesmo ou pelo morto? Estais pranteando a vós mesmo ou ao outro? Já chorastes por outrem? Já chorastes o vosso filho, morto no campo de batalha? Chorastes, decerto, mas essas lágrimas foram produto de autocompaixão ou chorastes porque um ente humano foi morto? Se chorais por autocompaixão, vossas lágrimas nada significam, porque estais interessado em vós mesmo. Se chorais porque vos foi arrebatada uma pessoa em quem “depositastes” muita afeição, não se trata de afeição real. Se chorais a morte de vosso irmão, chorai por ele! É muito fácil chorardes por vós mesmo porque ele partiu. Aparentemente, chorais porque vosso coração foi atingido, mas não foi atingido por causa dele; foi atingido pela autocompaixão, e a autocompaixão vos endurece, vos fecha, vos torna embotado e estúpido.
Quando chorais por vós mesmo, será isso amor? – chorar porque ficaste sozinho, porque perdestes o vosso poder; queixar-vos de vossa triste sina, de vosso ambiente – sempre vós a verter lágrimas. Se compreenderdes esse fato, e isso significa pôr-vos em contato com ele tão diretamente como quando tocais uma árvore ou uma coluna ou uma mão, vereis então que o sofrimento é produto do “eu”, o sofrimento é criado pelo pensamento, o sofrimento é produto do tempo. Há três anos eu tinha meu irmão; hoje ele é morto e estou sozinho, desolado, não tenho mais a quem recorrer para ter conforto ou companhia, e isso me traz lágrimas aos olhos.
Podeis ver tudo isso acontecer dentro de vós mesmo, se o observardes. Podeis vê-lo de maneira plena, completa, num relance, sem precisardes do tempo analítico. Podeis ver num momento toda a estrutura e natureza dessa coisa desvaliosa e insignificante, chamada “eu” – minhas lágrimas, minha família, minha nação, minha crença, minha religião – toda essa fealdade está em vós. Quando a virdes com vosso coração, e não com vossa mente, quando a virdes do fundo de vosso coração, tereis então a chave que acabará com o sofrimento.
O sofrimento e o amor não podem coexistir, mas no mundo cristão idealizaram o sofrimento, crucificaram-no para o adorar, dando a entender que ninguém pode escapar ao sofrimento a não ser por aquela única porta; tal é a estrutura de uma sociedade religiosa, exploradora.
Assim, ao perguntardes o que é o amor, podeis ter muito medo de ver a resposta. Ela pode significar uma completa reviravolta; poderá dissolver a família; podeis descobrir que não amais vossa esposa ou marido ou filhos (vós os amais?); podeis ter de demolir a casa que construístes; podeis nunca mais voltar ao templo.
Mas, se desejais continuar a descobrir, vereis que o medo não é amor, a dependência não é amor, o ciúme não é amor, a posse e o domínio não são amor, responsabilidade e dever não são amor, autocompaixão não é amor, a agonia de não ser amado não é amor, que o amor não é o oposto do ódio, como a humildade não é o oposto da vaidade. Dessarte, se fordes capaz de eliminar tudo isso, não à força, porém lavando-o assim como a chuva fina lava a poeira de muitos dias depositada numa folha, então, talvez, encontrareis aquela flor peregrina que o homem sempre buscou sequiosamente.
Se não tendes amor – não em pequenas gotas, mas em abundância; se não estais transbordando de amor, o mundo irá ao desastre. Intelectualmente, sabeis que a unidade humana é a coisa essencial e que o amor constitui o único caminho para ela, mas quem pode ensinar-vos a amar? Poderá uma autoridade, um método, um sistema ensinar-vos a amar? Se alguém vô-lo ensina, isso não é amor. Podeis dizer: “Eu me exercitarei para o amor. Sentar-me-ei todos os dias para refletir sobre ele. Exercitar-me-ei para ser bondoso, delicado e me forçarei a ser atencioso com os outros”? – Achais que podeis disciplinar-vos para amar, que podeis exercer a vontade para amar? Quando exerceis a vontade e a disciplina para amar, o amor vos foge pela janela. Pela prática de um certo método ou sistema de amar, podeis tornar-vos muito hábil, ou mais bondoso, ou entrar num estado de não violência, mas nada disso tem algo em comum com o amor.
Neste mundo tão dividido e árido não há amor, porque o prazer e o desejo têm a máxima importância, e, todavia, sem amor, vossa vida diária é sem significação. Também, não podeis ter o amor se não tendes a beleza. A beleza não é uma certa coisa que vedes – não é uma bela árvore, um belo quadro, um belo edifício ou uma bela mulher; só há beleza quando o vosso coração e a vossa mente sabem o que é o amor. Sem o amor e aquele percebimento da beleza, não há virtude, e sabeis muito bem que tudo o que fizerdes – melhorar a sociedade, alimentar os pobres – só criará mais malefício, porque quando não há amor, só há fealdade e pobreza em vosso coração e vossa mente. Mas, quando há amor e beleza, sabeis amar, podeis fazer o que desejardes, porque o amor resolverá todos os outros problemas.
Alcançamos, assim, este ponto: Poderá a mente encontrar o amor sem precisar de disciplina, de pensamento, de coerção, de nenhum livro, instrutor ou guia – encontrá-lo assim como se encontra um belo pôr-do-sol?
Uma coisa me parece absolutamente necessária; a paixão sem motivo, a paixão não resultante de compromisso ou ajustamento, a paixão que não é lascívia. O homem que não sabe o que é paixão, jamais conhecerá o amor, porque o amor só pode existir quando a pessoa se desprende totalmente de si própria.
A mente que busca não é uma mente apaixonada, e não buscar o amor é a única maneira de encontrá-lo; encontrá-lo inesperadamente e não como resultado de qualquer esforço ou experiência. Esse amor, como vereis, não é do tempo; ele é tanto pessoal, como impessoal, tanto um só como multidão. Como uma flor perfumosa, podeis aspirar-lhe o perfume, ou passar por ele sem o notardes. Aquela flor é para todos e para aquele que se curva para aspirá-la profundamente e olhá-la com deleite. Quer estejamos muito perto, no jardim, quer muito longe, isso é indiferente à flor, porque ela está cheia de seu perfume e pronta para reparti-lo com todos.
O amor é uma coisa nova, fresca, viva. Não tem ontem nem amanhã. Está além da confusão do pensamento. Só a mente inocente sabe o que é o amor, e a mente inocente pode viver no mundo não inocente. Só é possível encontrá-la, essa coisa maravilhosa que o homem sempre buscou sequiosamente por meio de sacrifícios, de adoração, das relações, do sexo, de toda espécie de prazer e de dor, só é possível encontrá-la quando o pensamento, alcançando a compreensão de si próprio, termina naturalmente. O amor não conhece o oposto, não conhece conflito.
Podeis perguntar: “Se encontro esse amor, que será de minha mulher, de minha família? Eles precisam de segurança”. Fazendo essa pergunta, mostrais que nunca estivestes fora do campo do pensamento, fora do campo da consciência. Quando tiverdes alguma vez estado fora desse campo, nunca fareis uma tal pergunta, porque sabereis o que é o amor em que não há pensamento e, por conseguinte, não há tempo. Podeis ler tudo isto hipnotizado e encantado, mas ultrapassar realmente o pensamento e o tempo – o que significa transcender o sofrimento – é estar cônscio de uma dimensão diferente, chamada “amor”.
Mas, não sabeis como chegar-vos a essa fonte maravilhosa – e, assim, que fazeis? Quando não sabeis o que fazer, nada fazeis, não é verdade? Nada, absolutamente. Então, interiormente, estais completamente em silêncio. Compreendeis o que isso significa? Significa que não estais buscando, nem desejando, nem perseguindo; não existe nenhum centro. Há, então, o amor.
Do livro “Liberte-se do passado”