- Consciência, Cérebro, Elementos, Relações, Estágios
Assim a verdadeira experiência conduz ao discernimento do processo da consciência (…) Para discernirdes profundamente a causa do sofrimento, não vos podeis separar do mundo e da vida e contemplar a consciência separadamente, pois só no próprio processo de viver é que podeis compreender a consciência. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 15)
A não ser que o indivíduo compreenda plenamente o processo da consciência, a ilusão pode momentaneamente proporcionar o necessário impulso para a ação, porém tal ação deve inevitavelmente conduzir a miséria e frustração. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 34)
Quando começardes a perceber a completa futilidade da própria carência, então dar-se-á o despertar dessa inteligência que produz verdadeiras relações com o ambiente. Só então poderá haver riqueza e beleza na vida. (Idem, pág. 34)
Que é a consciência? Há uma consciência de vigília, há uma consciência oculta; uma consciência de certas partes de mim mesmo, da mente superficial, e uma falta total de percepção a respeito das camadas mais profundas da consciência. (Tradición y Revolución, pág. 335)
Podemos começar de outro modo? No entanto, há um centro que é consciente de si mesmo, esse centro pode expandir-se ou contrair-se. (…) Esse centro pode tentar ir mais além das limitações que há posto em torno de si mesmo. Esse centro tem suas raízes profundas na caverna, e opera na superfície. Tudo isso é consciência (…) (Idem, pág. 336)(…) A consciência é percepção, é ouvir, ver, escutar, e é a memória de tudo isso e o responder de acordo com essa memória. (…) Nessa consciência está o tempo, tempo que cria espaço porque fica cercado. (…) Nisso há dualidade, não-dualidade, conflitos – eu devo, não devo – a totalidade desse campo é a consciência (…) E nisso não há espaço em absoluto, porque o espaço tem fronteiras, limitações. (Idem, pág. 143-344)
Interlocutor: Sim, entendo que temos aqui duas coisas que, de certo modo, podem ser independentes. Há o cérebro e a mente, embora estejam em contato. Dizemos então que a inteligência e a compaixão têm sua origem fora do cérebro. (…)
Krishnamurti: Ali! O contato entre a mente e o cérebro só pode ocorrer quando o cérebro está tranqüilo. (O Futuro da Humanidade, pág. 71)
Não se trata de uma tranqüilidade treinada. Não é um desejo autoconsciente, meditativo, de silêncio. É o resultado natural da compreensão do nosso próprio condicionamento.
Interlocutor: E desse modo, se o cérebro ficar quieto, ele poderia ouvir algo mais profundo?
Krishnamurti: Isso mesmo. Portanto, se ele está quieto, entra em contato com a mente. Nesse caso, a mente pode então funcionar através do cérebro. (Idem, pág. 71-72)
Interlocutor: Ou seja, essa atenção verdadeira entra em contato com o cérebro quando o cérebro está em silêncio.
Krishnamurti: Em silêncio e tem espaço. O cérebro não tem espaço agora, porque está preocupado consigo mesmo, está programado, é egocêntrico e limitado. (O Futuro da Humanidade, pág. 81-82)
Interlocutor: Mas quando o pensamento está ausente, o cérebro tem seu espaço?
Krishnamurti: Sim, o cérebro tem seu espaço.
Interlocutor: Ilimitado?
Krishnamurti: Não. Só a mente tem espaço ilimitado.
O que aconteceu ao cérebro que está para agir? Dissemos que a inteligência nasce da compaixão e do amor. Essa inteligência atua quando o cérebro está quieto. (Idem, pág. 82)
Tudo se registra nas células cerebrais. Cada incidente, cada impressão se grava no cérebro; pode-se observar em nós próprios vasto número de impressões. Perguntamo-nos como é possível irmos além e fazermos que se aquietem as células cerebrais. (Tradición y Revolución, pág. 199)
Investiguemo-lo. A capacidade de raciocinar, comparar, sopesar, julgar, compreender, investigar, racionalizar e atuar é tudo parte da memória. O intelecto formula as idéias, e daí provém a ação. (Idem., pág. 200)
As células cerebrais são o depósito da memória. A reação da memória é o pensamento. O pensamento pode ser independente da memória. (…) (Idem, pág. 200)
(…) O intelecto só pode conhecer a liberdade dentro do campo, como o homem que conhece a liberdade dentro de uma prisão. (…) Assim o homem jamais pode ser livre. (Idem, pág. 206)
Qual é o material sobre o qual deixa sua marca a experiência? Obviamente se trata do cérebro. De fato, as células são o material sobre o qual cada incidente, cada experiência – consciente ou inconsciente – deixa sua pegada. (…) (Idem, pág. 222)
(…) as células cerebrais trabalham dia e noite. Só quando a pessoa se levanta, na manhã seguinte, sabe se está cansada ou se dormiu bem, etc. Todas essas são funções do cérebro. Assim, o atman está dentro do campo do pensamento. Tem de estar. Nós dizemos que o atman é parte do cérebro. (…) (Idem, pág. 223)
Exporei (…) O cultivo de um cérebro, de qualquer cérebro, leva tempo. A experiência, o conhecimento, as recordações, são armazenados nas células do cérebro. Este é um fato biológico. O cérebro é resultado do tempo. Pois bem, este homem ao chegar a um ponto quebra o movimento. Ocorre um movimento por completo diferente, o qual significa que as mesmas células cerebrais experimentam uma mutação. (…) (Tradición y Revolución, pág. 275)
Um cérebro totalmente novo. (…) O velho cérebro está cheio de imagens, recordações, respostas, e estamos habituados a responder com o velho cérebro. A percepção não está relacionada com velho cérebro. A percepção é o intervalo entre a velha resposta e a resposta nova, a resposta que o cérebro velho ainda não conhece. Nesse intervalo o tempo não existe. (Idem, pág. 277-278)
Em geral, nosso cérebro é indolente. Nosso cérebro se tornou espesso, se embotou, por causa da educação, da especialização, do conflito, da luta psicológica interior em todos os seus aspectos, e também por causa das compulsões externas. Nosso cérebro só funciona quando se apresenta uma exigência, uma crise direta. Mas, afora essas circunstâncias, vivemos como que num estado hipnótico, monótono, funcionando indolentemente em nossos empregos e tarefas; por conseqüência, nosso cérebro não é penetrante, vigilante, desperto, sensível, e não pode desenvolver sua capacidade máxima. (O Despertar da Sensibilidade, pág. 120)
Se o cérebro não desenvolve sua capacidade máxima, não é capaz de ser livre. Porque a mente embotada, superficial, estreita, vulgar, só é capaz de reagir ao ambiente e, em virtude dessa reação, se torna escrava desse ambiente. Daí nasce o problema de nos libertarmos do ambiente, de deixarmos de ser escravos de toda sorte de influências, diretrizes, impulsos. Assim, o que é importante é sentir-nos totalmente livres. (Idem, pág. 121)
O pensar é um processo que nasce da experiência e do conhecimento. Escutem isso tranqüilamente, vejam se isso não é verdadeiro, real; então o descubram por si mesmos (…) O pensar parte da experiência, que se converte em conhecimento, o qual se acumula como memória nas células do cérebro; depois, a partir da memória, surgem o pensamento e a ação. (…) Essa seqüência é um fato real: experiência, conhecimento, memória, pensamento. Então dessa ação aprendemos mais; existe, pois, um ciclo, e essa é nossa cadeia. (La Llama de la Atención, pág. 15)
Estamos inquirindo se o pequeno cérebro pode, sem nenhuma influência exterior – científica, governamental, ambiental, religiosa ou de qualquer outra modalidade – se pode o limitado cérebro sofrer uma mutação. (…) Este é um problema sério. Não pode ser respondido com um simples sim ou não (…) Você deve olhar para a questão inteira como um todo. Não de um ponto de vista racional ou (…) religioso, com seus supersticiosos contra-sensos, ou de acordo com sua particular disciplina ou profissão. Deve-se considerar o todo da vida como um movimento unitário. (The World of Peace, pág. 16-18)
Antes de tudo, você admite que está condicionado? Está consciente – cônscio sem escolha – de que o seu cérebro está condicionado? Ou você aceita o que alguém diz e por isso simplesmente repete: “Meu cérebro está condicionado”? Vê a diferença? Se estou consciente de que meu cérebro está condicionado, tem isso um valor completamente diferente.
Mas se imagino que estou condicionado, meramente porque você mo diz, então esse conceito é muito superficial. Portanto, você está cônscio de que está condicionado – pela nacionalidade, por sua experiência, cultura, tradição, pelo meio ambiente, por toda a propaganda religiosa do cristianismo, budismo ou hinduísmo? (The World of Peace, pág. 18-20)
Mas o conhecimento também condiciona seu cérebro (…) como tradição, programado como você é por jornais, revistas, pela constante repetição de que você é inglês (…) Ou quando você vai à França, à Índia ou outro lugar qualquer, ocorre a mesma coisa, essa constante repetição de sua nacionalidade. Por isso, o cérebro se torna estúpido, repetitivo, mecânico. (…) (Idem, pág. 20)
Para sondar alguma coisa totalmente desconhecida, não preconcebida, não enredada em alguma ilusão sentimental ou romântica, deve haver uma qualidade do cérebro que seja completamente livre; livre de todos os seus conhecimentos, programações, de todo tipo de influência e, portanto, um cérebro que seja altamente sensível e tremendamente ativo.
É isso possível? Você possui um cérebro assim, ou ele é lento, preguiçoso e vive em seus próprios autoconceitos? Como é ele? Porque vamos pesquisar algo que exige uma mente, um cérebro, que esteja extraordinariamente vivo, não aprisionado em nenhuma forma de rotina, não mecânico. Você tem tal cérebro sem medo, livre de auto-interesse, não autocentralizado, ativamente? (The World of Peace, pág. 84) [Nota Revisor: ativamente o quê?]
Mas, como, de que maneira e em que nível irá realizar-se essa revolução? (…) E observa-se, também, que a mente, o próprio cérebro se tornou mecânico e, por conseguinte, repetitivo: ensine-lhe certo padrão de comportamento, certas normas de conduta, certas atitudes, desejos, ambições, etc., e ele ficará funcionando dentro desse canal, desse padrão. (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 90-91)
Pode-se, por conseguinte, ver que a própria natureza do cérebro deve passar por uma tremenda revolução – revolução que vos interessa, não na qualidade de indivíduo unicamente interessado em seu pequenino cérebro, porém na qualidade de ente humano. (…) (Idem, pág. 91)
A verdadeira questão, por conseguinte, é esta: É possível a vós e a eu promovermos essa mutação no uso do próprio cérebro, uma revolução que não seja processo gradativo, no tempo, porém revolução, mutação imediata, resultante da compreensão imediata? (Idem, pág. 93) Assim, se vos aprouver, limitemo-nos (…) ao que eu já disse. Percebemos a necessidade de uma revolução fundamental na própria estrutura do cérebro; “estrutura”, não no sentido biológico, porém a estrutura de nosso pensar (…) Para promover-se a revolução fundamental, necessita-se de grande quantidade de energia; e essa energia só pode tornar-se existente, quando há madureza (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 95)
Agora espere, talvez o senhor esteja certo. Quando o velho cérebro vê que nunca pode entender o que é liberdade; quando vê que é incapaz de descobrir algo novo, essa verdadeira percepção é a semente da inteligência, não é? (…) Pensei que pudesse fazer muitas coisas, e posso, em uma certa direção, mas em uma totalmente nova direção nada posso fazer. A descoberta disso é inteligência, obviamente. (La Verdad y la Realidad, pág. 411)
Agora, qual é a relação dessa inteligência com a outra? Obviamente, o velho cérebro, em todos estes séculos, pensou que pudesse ter seu Deus, sua liberdade, (…) fazer tudo que desejasse. E subitamente descobre que qualquer movimento do velho cérebro é ainda parte do velho; portanto, inteligência é o entendimento de que ele só pode funcionar dentro do campo do conhecido. O descobrimento disso é inteligência, dizemos. Agora, o que é esta inteligência? Qual é a sua relação com a vida, com a dimensão que o velho cérebro não conhece? (Idem, pág. 411-412)
Você vê, a inteligência não é pessoal, não é resultado de argumento, crença, opinião ou razão. A inteligência manifesta-se no ser quando o cérebro descobre sua falibilidade, quando descobre do que é capaz e do que não é. Agora, qual é a relação dessa inteligência com aquela dimensão? Prefiro não usar a palavra “relação” (Idem, pág. 49)
Pergunta: Que meios se emprega no funcionamento de decisões?
Krishnamurti: Aquilo que opera através da escolha e do desejo. Decide-se o curso da ação que se vai tomar, e tal decisão não é baseada na clareza, nem na observação do campo total, mas sim na satisfação e na distração, que são fragmentos daquele campo. E continua-se a viver nessa fragmentação. Este é um dos fatores de deterioração. Minha escolha de ser cientista pode estar baseada em influências ambientais, familiares, ou no meu próprio desejo de alcançar sucesso em certa direção. (…) (Exploration into Insight, pág. 65)
Pergunta: Você está dizendo que o cérebro não funciona completamente, mas somente em uma direção?
K.: O cérebro global não está ativo, e penso que este é o fator de deterioração. Você pergunta, qual é o fator de deterioração, não se a mente é capaz de ver ou não totalmente. Tenho observado, nestes muitos anos, que a mente que segue certo curso de ação, desconsiderando a totalidade da ação, se deteriora. (Idem, pág. 66)
A ênfase dada à compreensão da consciência individual não deve ser tomada como mais um encorajamento do egocentrismo (…) É somente por meio da compreensão do processo da consciência individual que pode dar-se a ação espontânea e verdadeira, sem criar ou aumentar ainda mais a tristeza e o conflito. (…) Portanto, devemos compreender profundamente o processo da individualidade (ente individualizado) com sua consciência. (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 10)
Portanto, deve haver profunda percepção, isenta de escolha, para compreender o processo da consciência. Essa necessidade surge apenas quando há sofrimento. Para descobrir a causa do sofrimento, a mente deve ser aguda, plástica, sem escolha (…) Se não houver discernimento do processo da consciência individual, então a ação criará sempre confusão, limitação, e, portanto, produzirá sofrimento e conflito. (…) (Palestras em Ommen, Holanda, 1936, pág. 14)
(…) não podemos descartar o nosso saber, nossas experiências e lembranças, pois essas coisas têm existência. (…) O homem que está observando o perpassar das suas experiências, lembranças, conhecimentos, sem a essas coisas se prender, esse homem não aspira à virtude, não está acumulando. E quando a mente já não está acumulando, quando a mente está desperta para todo o processo da consciência, com todas as suas lembranças e seus motivos inconscientes, todos os impulsos de gerações, de séculos, deixando tudo isso passar por ela sem a prender – não se acha então a mente fora do tempo? (Poder e Realização, pág. 72)
O tempo é uma duração, um movimento. Está sempre a fluir do passado, através do presente para o futuro. O passado é o conhecimento, a experiência, a conclusão, a tradição, a herança racial, etc., etc. (…) Todo esse processo, de ontem, hoje e amanhã; o condicionamento de ontem, que se modifica no presente e toma forma amanhã – esse processo , sem dúvida, constitui a consciência. (…) (Encontro com o Eterno, pág. 122)
Psicologicamente, a coisa é muito mais complexa. Toda a psique é feita de tempo, pertence ao tempo. Todo o processo do pensar é resultado do passado, (…) do conhecido, como experiência, conhecimento, conclusões. (…) Essa consciência é: eu era, eu sou, eu serei – modificado, ampliado, alongado, limitado. Isso constitui a consciência, o que somos – tanto o consciente como o inconsciente. Parecemos atribuir enorme significado ao inconsciente, mas o inconsciente é o passado. (…) (Idem, pág. 122)
Nosso problema, se estamos verdadeiramente atentos, é este: Se os conflitos, as atribulações e os pesares de nossa existência diária podem ser resolvidos por outra pessoa (…) Para se compreender um problema, requer-se, evidentemente, certa inteligência; e essa inteligência não pode resultar da especialização (…) Ela só se manifesta quando estamos passivamente cônscios de todo o processo de nossa consciência, o que significa estar cônscios de nós mesmos sem escolha. (…) Porque, quando estais passivamente vigilantes (…) o problema assume um significado de todo diferente (…) não há julgamento e, por isso, o problema começa a revelar-nos o seu conteúdo. (…) (Solução para os nossos Conflitos, pág. 77-78)
Vós, homens, como indivíduos, desenvolveis vossos sentidos pela luta social, pela autopreservação, e dais início, assim, à consciência da separação. Desde a infância vos foi incutida a idéia de que sois uma entidade separada; e dessa ilusão provém a divisão entre “vosso” e “meu”, no que pensais e no que sentis, no que possuís e em todas as coisas. (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág.18)
Em virtude de tal entendimento de separatividade, o “eu” torna-se todo poderoso; dessa consciência de separação nasce o medo. E onde quer que exista o medo, manifesta-se imediatamente o desejo de buscar conforto, em lugar do entendimento que dissipa todo o temor. Pois o conforto adormece vosso temor inato de perder vossa identidade separada. (Idem, pág. 19)
Nossa principal preocupação deverá ser, então, descobrir de que modo cada um poderá ficar cônscio desse eterno, dessa viva realidade que sustenta, nutre e eleva todas as coisas e que se acha em nós mesmos. (…) (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 21)
Quando o homem está consciente de si próprio como entidade separada, continuamente busca o exterior para encontrar auxílio, para sua subsistência, para seu bem estar; e desse modo cria ele a desordem em lugar da ordem, e por causa dessa desordem surgem as superstições, as ilusões, as cerimônias. (Idem, pág. 21)
Quando introduzis o elemento pessoal em vosso julgamento, inevitavelmente perverteis vossa compreensão. Necessitais distinguir entre o que é pessoal e o que é individual. O pessoal é o acidental, (…) as circunstâncias de nascimento, o ambiente (…), vossa educação, vossas tradições, vossas superstições, vossas distinções de nacionalidade e classe (…) (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 23)
Enquanto houver tal consciência de separação, do “eu”, da personalidade, não pode existir a realização da verdade; antes, porém, que possais transcender essa consciência, tendes de vos tornar plenamente autoconscientes. Tal significa que necessitais vos tornar conscientes de vós próprios como indivíduos, não como uma máquina (…) (Idem, pág. 24)
Antes que vos possais tornar plenamente conscientes, e, dessa forma, perder a autoconsciência, há três condições a passar, relativas à consciência. Na primeira delas, o indivíduo é escravo dos sentidos e de seus anelos. Para satisfazê-los, torna-se ele simplesmente egoísta, dependendo, inteiramente, para sua felicidade, das coisas exteriores, das sensações e excitações, (…) emaranhado na tristeza e na dor. (…) (Idem, pág. 24-25)
Toma cada vez maiores responsabilidades sobre si e torna-se, por essa forma, um simples escravo da ação. Tal homem não tem tempo nem inclinação para a quietação do pensamento, para a reflexão, para o exame. Pois a verdadeira reflexão cria a dúvida, as investigações levam ao isolamento, ao afastamento, o que ele cuidadosamente evita. (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 25)
Depois, vem o segundo estádio, em que o homem se apercebe de suas faltas, de seus defeitos, de suas ilusões, de suas crueldades. Tornando-se, assim, consciente de sua própria natureza, tenta desembaraçar-se, livrar-se do domínio dos sentidos e começa a libertar a mente e o coração. (Idem, pág. 25)
Começa por diminuir, gradualmente, as próprias responsabilidades, sem abandonar sua vida na torrente do mundo. A ação, nascida da consciência de si mesmo, e na qual existe a separatividade, é embaraçante, limitadora, pesada; porém a ação que é resultado da liberdade, da individualidade (ente individualizado) é libertação. (Idem, pág. 25)
O individuo que possui, agora, o forte desejo de libertar-se, começa a disciplinar-se. Essa disciplina não lhe é imposta pelo exterior, não é resultado de repressão; antes, em virtude do seu desejo de ser livre, de realizar a verdade, impõe ele a si próprio uma disciplina oriunda do entendimento – não oriunda do medo, não coagido pelas circunstâncias sociais ou pelo ambiente. Deseja então libertar a mente, o coração e, desse modo, viver em harmonia. (…) (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 25-26)
Em seguida vem o terceiro estádio da consciência, em que o homem está completamente senhor dos sentidos, (…) do seu corpo. Isso não significa ser desenvolvido muscularmente (…); será senhor do corpo, no sentido de não mais se emaranhar em seus anseios, suas sensações e excitações. (Idem, pág. 26)
Começa ele, então, a libertar-se do medo e das ilusões que ele próprio cria. Uma vez que estejais libertos das ilusões, do temor, de todas as outras qualidades, haverá para vós um como retiro interior nascido da alegria, retiro nascido não do tédio, nem do retraimento, nem do intuito de fugir a este mundo de conflito, porém um retiro interno de alegria em meio da ação. (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 26)
Quando tal acontecer, a reflexão e a análise virão dar lugar a uma concentração tremenda; não a concentração sobre um objeto, mas a concentração em que não há sujeito nem objeto, o pleno conhecimento em que não há mais contrastes. (Idem, pág. 26)
Ulteriormente, proveniente desse retiro, manifesta-se uma harmonia interior, a equanimidade entre a razão e o amor – o pensamento liberto das fantasias e teorias pessoais, o amor liberto da especialização, amor que é como o perfume de uma flor. (Coletânea de Palestras, 1930-1935, pág. 27)
Quando existe essa harmonia, não mais se inquire a respeito do futuro e do passado. (…) O passado, com suas faltas e tristezas, desaparece, e o futuro, com suas esperanças, anseios e antecipações, desaparece também; oriunda desses dois termos, nasce a harmonia do presente, a qual é a realização dessa inteireza que existe em todas as coisas. Quando ela for realizada, haverá tranqüilidade, haverá a realidade viva da felicidade. (Idem, pág. 27)
Agora, a questão é esta: Nosso cérebro é o resultado de dois milhões de anos, do animal até nossa presente situação, qualquer que seja ao grau de evolução que tenhamos atingido – pois ainda somos “o animal”. (…) Vós tendes de libertar vossa mente do “animal” ou seja, da avidez, da inveja, do medo, da ambição – de todas as nossas estúpidas trivialidades (…) Só então poderá a mente transcender a si própria e descobrir se há uma Realidade, Deus, alguma coisa de atemporal. (Uma Nova Maneira de Agir, 1ª ed., pág. 26)